VAI IDADE...
A SEDA QUE ENCOBRIA
MEU CORPO JOVEM
AMARROTOU
DESFAZENDO O GLAMOUR.
AMARROTADA,
PASSO ESTA ROUPA SECA
QUE ME DÁ GASTURA
COM PROMESSAS DE BELEZA
QUE NÃO VOLTA MAIS.
EMBAÇADA
A IMAGEM DO PASSADO
VIVE APENAS NA MEMÓRIA.
RELUZENTE
A IMAGEM DO PRESENTE
SE MAQUEIA E DISFARÇA
O TEMPO QUE PASSOU.
TREMIDA
A IMAGEM DO FUTURO
NÃO OUSA APRESENTAR-SE.
VAI IDADE...
DESGRUDE DE MIM
NÃO TE QUERO MAIS
FICASTE VELHA E INDESEJÁVEL
PARA UM NOVO CASAMENTO.
VAI IDADE...
NÃO ME LEVE JUNTO
LEVE O QUE SOU
TRAGA O QUE EU ERA
O NÓ DA
VAIDADE
Aparecida,
professora primária, parecia ser uma pessoa muito medrosa e insegura. Tinha
medo de falar e aparecer em público, escrever ata, dirigir carro, embora
soubesse como fazer tudo isto. Abandonou seu curso superior de Pedagogia, já no
primeiro período, com o temor de não dar conta de enfrentar as dificuldades.
Aparecida, era de fato, uma pessoa medrosa, no entanto existia uma dificuldade
maior que tentava manter velada e que acionava o seu medo. A vaidade excessiva
era um censor constante que não deixava Aparecida se expressar livremente, a
menos que, pudesse demonstrar perfeição naquilo que fosse solicitada. Aparecida
era acometida por fortes crises de ansiedade todas as vezes que fosse
requisitada a executar tarefas simples que lhe garantisse apenas um resultado
mediano, pois o seu mais profundo desejo era alcançar a inatingível perfeição.
O mais interessante é que era vaidosa demais para admitir que pudesse ser
vaidosa. Melhor enaltecer o medo para jamais ter que entrar em contato com um
sentimento tão vil dentro de si mesma. Assim, o seu medo crescia, dia após dia,
para protegê-la de si mesma, ou mais precisamente, de sua sombra. Só o processo
de psicoterapia ajudou Aparecida a admitir a sua vaidade, após compreender o processo
que deu origem a este sentimento.
Aparecida foi
uma criança muito cobrada por sua mãe e por professoras que exigiam sempre uma
ótima conduta e ótimos resultados. Era severamente punida se não satisfizesse
os altos padrões de exigência destas educadoras que a deseducou para a
vida. Para se safar das punições e
castigos que outrora irmãos e colegas recebiam e para não sofrer a rejeição de
pessoas que tanto amava, base da formação de sua futura personalidade, Aparecida
passou a se cobrar perfeição como forma de proteção. Jamais seria humilhada se
desenvolvesse a identidade apreciada pela mãe e pelas professoras, proteção
indispensável naquele momento de tamanha vulnerabilidade. Introjetava,
temerosa, a humilhação e sofrimento que os colegas sofriam, todas as vezes que
não se comportavam conforme o esperado pelas figuras de autoridade. Cultuando
uma perfeição que lhe garantisse a posição de melhor, asseguraria o amor e o
respeito que faltava a estes. O desejo de ser a melhor para se proteger lhe
rendeu a vaidade que tanto lhe incomodava e tentava esconder.
Ver-se envolvida
pelo olhar do outro era outra situação que a incomodava profundamente. Este
olhar era sempre percebido como reprovador, pois acostumou-se, na infância, a
perceber o olhar das figuras de autoridade como um ato exclusivo de reprovação
e censura. Parece que suas educadoras não tinham tempo, disposição e aparato
emocional que permitisse um olhar de carinho e presença amorosa. A busca
inalcançável de perfeição era a única forma que, ilusoriamente, encontrou para
extrair um olhar de aprovação. No entanto, apesar de todo seu esforço, jamais
viveu a sensação de ter conseguido isto. Aparecida cresceu, mas, sempre residiu
dentro dela, uma criança faminta de afeto e valorização pessoal.
É difícil admitirmos que somos vaidosos. Como
Aparecida, é mais fácil focalizarmos em nossos medos, já que medo é um
sentimento mais aceito socialmente. Até as religiões repugnam a vaidade,
considerando-a um pecado. Ninguém quer ser considerado um pecador. Ser medroso
desperta compaixão no outro, por outro lado, ser vaidoso desperta repugnância e
convenhamos, ninguém deseja ser rejeitado, muito menos uma pessoa vaidosa que
se viciou em admiração.
O vaidoso apesar de parecer auto-suficiente é, na
verdade, extremamente inseguro. Não gosta de admitir e deixar transparecer seus
limites e erros, assim, torna-se uma vítima perfeita da ansiedade quando se
propõe fazer algo novo que já não esteja por demais familiarizado. É atingido
por doses maciças de adrenalina ao enfrentar uma situação nova, pois exige de
si ser o melhor. Sem esta exigência, foge deste enfrentamento.
O vaidoso possui uma grande ferida narcísica, ou seja,
em algum momento de sua vida sentiu-se muito humilhado ou ameaçado. O orgulho é
uma possante armadura que o protege de novas ameaças neste sentido. Perder a própria
identidade para assumir a identidade que o seu manipulador gostaria que tivesse
é outra forma de se proteger. Aparecida, por exemplo, não sabia o que gostava,
o que queria da vida, que caminho gostaria de trilhar. Estava sempre à espera
que alguém lhe delegasse um papel. Na terapia, estava sempre à espera que eu
sugerisse o conteúdo a ser trabalhado. Por fugir tanto dos desafios, não criava
problemas para a sua vida, aliás, o seu grande problema era não ter problemas.
Inicialmente dizia enfaticamente que o seu único problema era o medo,
posteriormente descobriu que o seu maior problemas era fugir dos mesmos
criando, assim, uma vida vazia e sem objetivos.
O vaidoso só suporta o olhar do outro se for para ser
admirado. Como Aparecida, ele enxerga em todo olhar a reprovação dos limites e
defeitos que, a quatro chaves, asila dentro de seu ser.
É comum confundirmos vaidade com amor próprio e vice
versa. Não é muito fácil delimitar a zona de transição entre um e outro. Talvez
o termômetro de avaliação seja o grau de conforto e desconforto que cada um
causa em nossa alma. Amar a si mesmo, admirar-se, não dói e nem exige de nós
mesmos estratégias de ocultamento de nossos limites e erros. Quem se ama é, sobretudo,
muito tolerante consigo mesmo. Cuidar de si mesmo não é vaidade, no entanto,
cuidar de forma obsessiva de uma imagem idealizada é uma atitude vaidosa
geradora de muita ansiedade e sofrimento.
Tem muita gente usando máscaras para ocultar a verdadeira
imagem. Não aceitam a realidade. Transitam rapidamente por aquilo que são e
estacionam a vida na ilusão de uma imagem inalcançável. Não se aceitam, fogem
de si e correm atrás do inatingível. Por trás de uma máscara de felicidade,
repousa uma face triste, repleta de desencanto. Difícil viver assim! Para quem
tem esta dificuldade, a estória do Leão Jujuba poderá ajudar a transformar
vaidade em amor próprio.
A JUBA DE
JUJUBA
Jujuba era um
leão que tinha muito orgulho de sua juba. Farta e comprida, chamava atenção de
toda bicharada da floresta, além de impor certo respeito. No fundo, Jujuba até
achava que o respeito que conquistou se devia a sua linda e poderosa juba.
Assim, cuidava da mesma como se fosse o seu bem mais precioso. Lavava com os
melhores shampoos feitos de ervas raras da floresta, alisava e desembaraçava
cuidadosamente com escova feita de pele de porco espinho para que nenhum fio
pudesse se arrebentar ou ficar quebradiço, cacheava as pontas com rolos
confeccionados com chifres de cervos, hidratava-os com óleos extraídos das
amendoeiras mais antigas da região e fazia reflexos banhando-os com raios
solares no início da manhã.
Muitos
invejavam a juba de Jujuba e a maior aspiração da bicharada era poder
conquistar uma juba que lhes garantisse poder. Alguns passavam uma vida inteira
pelejando com suas jubas esfarrapadas, outros nem sequer pensavam na
possibilidade de ter uma juba um dia e se lamentavam :
¾Ah, se eu pudesse ter uma juba assim!
Seria admirado e respeitado por todos.
O que Jujuba
mais gostava era ficar horas se admirando nas águas do lago de águas mais
cristalinas da selva e se algum cisco caía sobre as águas do mesmo
marejando-as, o leãozinho vaidoso ficava profundamente irritado. O macaco Sopé,
que vivia feliz se divertindo e pulando de galho em galho sem nunca se
preocupar com juba alguma, ficava surpreso com a obsessão que Jujuba sentia
pelas águas do lago. Não se aguentando de curiosidade perguntou:
¾Por que você olha tanto para as águas
deste lago? Perdeu alguma coisa aí?
¾ Perder? E por acaso eu sou de perder
alguma coisa na vida? Perder é coisa de bicho fracassado. Toda vez que eu olho
para estas águas eu encontro uma coisa linda e especial.
¾ Eu também posso ver esta coisa linda
que você vê aí? Perguntou Sopé.
¾ Com certeza! Venha até aqui, fique do
meu lado e observe atentamente.
O macaco desceu
da árvore, dirigiu-se para as margens do lago e fitou as águas do mesmo
procurando esta coisa maravilhosa que o leão dissera existir ali.
¾ Que graça você nisto? Perguntou o
macaco com sarcasmo.
¾ Como é que você pode dizer uma coisa
desta? Respeito é bom, eu gosto e exijo. Berrou o leão exalando cólera. Nunca
ninguém havia desprezado a sua imagem e, de repente, aquele macaco tolo ousava
desconsiderar a sua beleza.
¾Não entendi sua irritação... Não sei por
que estes fachos de folhas, sementes e frutos sepultados no fundo exigem tanto
o seu respeito e o de todos nós. Eu, particularmente, as prefiro no pé.
O leão ficou
mais surpreso ainda com a observação de Sopé. Como ele pudera enxergar folhas
ao invés de sua nítida e linda imagem? Acionando as suas garras com clara
intenção de ferir o macaco, urrou com braveza:
¾Some daqui, seu idiota! Você além de
cego é burro. Não consegue captar e admirar as coisas belas da vida.
Sopé,
querendo se defender, deu um pulo no primeiro galho de árvore à sua frente e
sumiu para dentro da selva, sabia que apesar de não possuir a força do leão,
foi agraciado com muita agilidade e esperteza pela vida. Naquele exato momento,
o seu instinto de sobrevivência lhe alertou deixando uma mensagem muito
importante:
¾Fuja, pois Jujuba tem fome de admiração
e você acabou de negar este alimento a ele.
O leão, por
outro lado, ficou ali, sentado á beira do lago urrando de raiva:
¾Será que ele realmente é um idiota ou
será que ele quis bancar o indiferente comigo? Se tem uma coisa que eu não
suporto é a indiferença de alguém. Com certeza, ele morre de inveja de mim por
não ter sido contemplado com a minha beleza e força. Fica querendo me
desqualificar para se sentir mais importante do que eu.
Repentinamente,
foi interrompido por uma hiena invejosa que passava por ali.
¾O que aconteceu, Jujuba? Você me parece
tão irritado... Será que posso te ajudar. Você sabe o quanto gosto de você e o
quanto lhe admiro. Não gosto de te ver chateado.
¾Sopé, aquele idiota, quis bancar o
indiferente comigo. Você acredita que ele não conseguiu enxergar a minha imagem
nestas águas? Eu fico pensando como alguém pode ser tão cego assim. Será que
você também teria esta dificuldade ou imbecilidade? Perguntou, Jujuba, com ar
de censura e ameaça.
¾Absolutamente! Daqui mesmo eu já estou
vendo a sua juba reluzindo como um sol no fundo deste lago. Completou a Hiena,
enxergando apenas os fósseis de árvores, mas com claras intenções de agradar o
amigo e ganhar a sua admiração. Sabia que o maior trunfo que possuía com o
amigo vaidoso era: “Contrariar, jamais!”.
Jujuba
sentiu-se irradiante com as observações da amiga. Para ele, aquela era, de
fato, uma pessoa de visão. Querendo receber mais elogios, cedeu também à mesma
doses significativas de admiração. Sabia que a melhor maneira de colher elogios
era acariciar o ego do outro.
¾Você é uma pessoa de visão! Tem gente
que não enxerga um palmo adiante do seu nariz. Acho que aquele macaco só
enxerga bananas.
¾Não sei como você, uma pessoa tão inteligente
e brilhante, pôde ser atingido pelas idiotices de Sopé que vive alienado. Como
é que você poderia imaginar que ele teria capacidade de enxergar aquilo que é
realmente significativo na vida ?
Uma crítica
recheada de elogios jamais feria o ego de Jujuba, pelo contrário, era um
incentivo para se gabar ainda mais:
¾Eu sou muito ingênuo e humilde. Acredito
na capacidade e nas boas intenções de todo mundo. Preciso aprender a colocar
mais maldade nas coisas para não ser alvo de tanta inveja. O papo está bom, mas
preciso ir. Tenho um encontro muito especial hoje com uma leoa gatíssima.
¾Você vai se encontrar com Formosa?
Perguntou a hiena.
¾Que Formosa, que nada! Esta leoa já é
carta fora do baralho. Tem tanta gata linda por aí; eu não costumo ficar perdendo
meu tempo apenas com uma. Quem pode se gabar tem que aproveitar! Quem se ama
tem que exigir produtos de boa qualidade. Porcaria, nem pensar!
¾Você não é bobo, nada! Boa sorte! Quem
dera se eu tivesse o prestígio que você tem. Não precisaria ficar me satisfazendo
com as mocorongas que aparecem nas paradas.
¾Leoa feia é que nem leão para mim. Só
mostro as garras. Completou Jujuba com sarcasmo se despedindo do amigo.
O tempo
passou como passa para todos. Novos leões nasceram, cresceram e foram dominando
a selva. Muitas coisas mudaram, no entanto, Jujuba não foi, ao longo de sua
vida, preparado para mudanças. Estava acostumado com a visão estática de si
mesmo. As mudanças acarretam perdas, coisa que nunca soubera lidar. Seu espaço
foi ficando, com o passar dos anos, cada vez mais reduzido roubando-lhe o
prestígio de outrora. Como num passe de mágica, sua visão foi ficando confusa.
Quando se olhava no lago ainda podia ver aquele leão vigoroso de sempre, no
entanto, quando se via nos olhos dos outros, via um leão feio, fraco e velho. Parecia
que o mundo passou a ser reinado por infinitos Sopés e as hienas extintas do
planeta. Sentia-se só e um grande fracassado, apesar de negar estes sentimentos
para si mesmo. Quando alguém passava cumprimentando-o e perguntando como
estava, respondia:
¾Maravilhoso, como sempre!
Sua Juba
perdeu o viço de antes. Poucos fios quebradiços e sem luz restavam no alto de
sua cabeça. Era como se um rei tivesse perdido a sua coroa e a sua majestade.
Os bichos mais velhos, que o conhecia desde a mocidade, comentavam,
discretamente, entre si:
¾A juba de Jujuba já não é mais a mesma!
A criançada,
por outro lado, com um jeito imaturo e perverso, zombava com versos
cantarolados:
¾Jujuba não tem Juba
Cadê a juba de Jujuba
Juba, juba, juba
Fula, fula é esta juba
É terrível
quando vemos no olhar do outro aquilo que nos falta ou nos limita; pior ainda é
escutar sentenças de desrespeito e reprovação. Viver assim foi deixando Jujuba
muito ferido. Para não entrar em contato com aquilo que não dava conta de
encarar, assumir e enfrentar foi, aos poucos, se afastando de todos os bichos
da floresta. O leão solitário não havia formado família. Para se ter uma
família de verdade é fundamental que qualquer ser seja capaz de enxergar algo
mais que si mesmo. Jujuba não foi capaz disto. Passou uma vida inteira sem
aprender e sem se esforçar neste sentido. Além de perder a beleza e a força,
perdeu também a coragem, a alegria e a satisfação de viver. Tomado por uma
grande depressão, entrou para dentro de uma grande caverna escura. Tomado por
esta escuridão, foi um dia despertado por uma coruja que morava, também, dentro
desta caverna.
¾Sou a guardiã deste mundo que você se
encontra agora. Quer que eu lhe traga a morte de presente?
¾Morte? Urrou sem força e tomado de medo.
¾Sim – completou a coruja. Você está mais
morto do que nunca. Talvez a morte lhe traga mais vida e mais luz. Mas, antes,
você precisa conquistar uma coisa muito importante, caso contrário, vai vagar
para sempre no reino das trevas.
¾Eu já conquistei muitas coisas nesta
vida. Não creio que precise conquistar mais nada. Prosseguiu o leão apegado ao
orgulho que sempre lhe venceu.
¾Mesmo no fundo do poço, você não perde a
majestade – Ironizou a coruja sem a mínima intenção de consola-lo – Você tem
certeza que não deseja conquistar mais nada? Eu posso providenciar, neste
minuto, o seu passe para o outro lado. Só que você não vai gostar, nem um pouco,
do que vai encontrar lá.
Jujuba
percebeu que era melhor ceder à humildade que sempre rejeitou. Não tinha mais
nada a perder. Mesmo que negasse, sabia que havia perdido tudo. A única coisa
que lhe restava eram alguns tímidos lampejos de vida.
¾Tudo bem! O que é que eu tenho que
conquistar?
¾Agora sim! Estou gostando de ver...
¾Epa! Não começa... Não estou aqui para
ser humilhado. Urrou o leão aproveitando-se das poucas centelhas de força que
ainda possuía.
¾Para quem acostumou a humilhar o outro é
esperado que veja humilhação em tudo. Desde quando estou lhe humilhando ao
dizer que estou gostando de ver algum lustro de humildade em você? Perguntou a
coruja desafiando-o.
Sem querer se
ater a uma questão tão delicada e incômoda, Jujuba perguntou já irritado:
¾Seja mais direta. Não gosto de rodeios.
O que é que eu tenho que conquistar?
¾Você precisa conquistar a consciência de
que foi um fracasso. Respondeu a coruja sem rodeios.
¾Quem é você para dizer que sou um
fracasso!
¾Sou a guardiã da morada obscura do seu
ser. Respondeu com firmeza.
Jujuba
percebeu que apesar de pequena e frágil, aquela coruja parecia ser uma
autoridade. Com toda majestade do passado ainda encrostada em sua alma, sentia
que não mandava nada ali. Na verdade,
não tinha outra saída a não ser se resignar.
¾Como pode dizer que fui um fracasso se
consegui conquistar a admiração de todos? Em toda a minha vida, me lembro
apenas de um macaco idiota que não conseguiu enxergar o meu brilho.
¾Talvez, ele tenha sido o único a
aproximar de você sem desejos de lhe paparicar. Apesar de você não saber, tem
bicho que não se liga em confeccionar imagem idealizada de si e dos outros. Vive a vida como ela é de fato.
¾Que vida é esta que você está falando?
Perguntou Jujuba.
¾Uma vida que não coube em você. O seu
orgulho, a sua vaidade, a sua prepotência eram as únicas coisas que lhe cabiam.
Admita que não viveu! Passou uma vida inteira babando em cima de uma imagem que
você idealizou para si mesmo. E, o pior é que exigia isto dos outros também.
¾Eu não exigi nada de ninguém!
A coruja deu
uma grande risada. Tomada pelo riso continuou:
¾Ai de quem não admirasse você! Tornava-se,
com certeza, vítima de sua ira. O máximo que conseguiu fazer para dominar o seu
orgulho e a sua raiva foi dar uma de coitadinho. O que não muda muita coisa...
¾Você está muito enganada! Todo mundo me
amava. Tanto é que fariam de tudo para ser igual a mim.
¾Ser amado é bem diferente de ser
paparicado. O sabor da fruta do amor, você desconhece e agora é bem tarde para
prová-la.
¾Você quer dizer que eu não fui agraciado
pelo amor? Já que é assim, eu não tenho culpa de não ter provado esta fruta.
¾Espertinho! Você é fera nas
justificativas. Só que esta não cola não. O pomar de sua vida sempre esteve
repleto desta fruta. No entanto, você as deixou apodrecer no pé. Será que resta
alguma ainda?
Jujuba
limitou-se a ficar calado expressando uma profunda decepção para consigo mesmo.
Não havia desculpas que pudesse absolvê-lo. Sentiu ali, naquele momento, que a
sua consciência não aceitava mais ser ultrajada com as máscaras que usou a vida
inteira. Percebeu que lhe restava ainda algumas horas para aceitar aprender o
que sempre rejeitou. Humildemente, lamentou sua condição para a coruja.
¾Eu sempre pensei que me amasse
profundamente...
¾Você só amou a imagem que construiu.
Quando ela se ruiu, você começou a se destruir até chegar ao ponto em que se
encontra agora. Quem ama não se destrói.
¾Tenho que admitir que você tem razão.
Não adianta mais eu negar o que está óbvio. Você retirou as vendas que a
alienação e o meu egocentrismo colocaram sobre a minha alma. Será que disponho
de algum tempo a mais para viver, pelo menos, um minuto de amor?
¾Vou lhe dar vinte e quatro horas a mais
de vida para que você jamais se esqueça o quanto o dia é longo e quanto você o
desperdiçou. Aproveite, se for capaz!
Com muita
dificuldade, frágil e sem força, Jujuba levantou dirigindo-se para a porta da
caverna. Precisava, agora, apossar-se da maior valentia que sempre lhe faltou a
vida inteira: “Olhar profundo nos olhos da vida”. Assim que ultrapassou a porta
da caverna, uma luz lhe cegou os olhos lhe oferecendo uma outra visão. Já não
enxergava mais o Jujuba de antes, agora via as árvores, os animais, os rios,
lagos e um céu muito azul que lhe transmitia uma tranquilidade jamais
vivenciada. Respirava fundo e sentia o aroma da natureza penetrando e
purificando o seu ser mais íntimo. O vento que tocava o seu corpo, massageava-o,
carinhosamente, dissipando cada tensão que o seu orgulho edificou. A terra que
pisava lhe dava uma importante lição de acolhimento. Esta terra recebia todos,
indiscriminadamente, até mesmo ele que nunca percebera a importância da mesma.
A água que corria pelos rios fazia brotar, no fundo de sua alma, um intenso
desejo de renovação. Jogou-se dentro do mesmo e tudo aquilo que não lhe cabia
mais. Viu a correnteza levar toda vaidade e prepotência que o desnutriu durante
toda a sua vida. Já quase no final da tarde, quando o sol repousou no
horizonte, Jujuba parou, pela primeira vez, para admirar este espetáculo que a
natureza lhe ofereceu durante toda a vida sem que percebesse. Emocionado com
tamanha beleza, desceram de seus olhos lágrimas abençoadas que limparam ainda
mais a sua alma fazendo a faxina final em cada cômodo de seu ser. Finalmente,
seria agradável morar numa casa assim, límpida, humilde e sem a antiga
luxuosidade que lhe impedia ter liberdade de transitar em si mesmo. Agora, mais
parecido com o sol e aquecido pelos últimos raios do mesmo, foi morrendo
devagarinho, mas certo de que iria renascer no outro dia com uma nova
consciência.
ESPAÇO DE REFLEXÃO
Será que você é uma pessoa mais preocupada com a sua
vaidade ou com seu amor próprio? As reflexões abaixo poderão esclarecer isto.
Se você alimenta a sua vaidade, com certeza, se identificará com a maioria das
questões abaixo:
( ) Não suporto
a ideia de me apresentar ao outro sem uma produção prévia
( ) Fico preocupado(a) com a imagem que o outro fará
de mim se me vir exatamente do jeito que sou, sem as minhas máscaras
( ) Quero
que me achem sempre maravilhoso(a)
( )Dou muito
valor à minha aparência
( ) Os sinais
de idade que aparecem pelo meu corpo, à medida que envelheço, me deixam
extremamente angustiado(a)
( ) Uso todos os métodos que me são acessíveis para
retardar os sinais de decadência de meu corpo, métodos estes, muitas vezes
agressivos.
( ) Quero ser
o exemplo a ser seguido
( ) Dependo de
elogios para me sentir bem
( ) Desejo
brilhar, ser o máximo e ter sempre uma plateia para aplaudir os meus feitos
( ) Dou o
máximo de mim para me tornar o máximo aos olhos do outro
( ) Escondo, a
quatro chaves, os meus pontos fracos
( ) Invejo a
beleza do outro
( ) Sou capaz
de prejudicar a minha saúde para investir na minha beleza
( ) Se não sou
aprovado(a) e elogiado(a), sofro profundamente
( ) Valorizo a
minha imagem mais do que tudo nesta vida
( ) Passo mais
tempo me embelezando (seja fisicamente ou ao ego) do que vivendo outras
experiências gratificantes da vida
( ) Deixo de ir
a lugares ou de viver algumas experiências para não ter que mostrar uma imagem
que rejeito em mim
DINÂMICA
Coloque uma
cadeira de frente para outra cadeira. Escolha uma vaidade que lhe domina.
Dramatize o papel de dois personagens. Um deles com a tal vaidade e o outro sem
ela. Cada cadeira deverá acolher um personagem. Dramatize um diálogo entre os
dois. Assente-se na cadeira do vaidoso
sempre que este tomar a palavra e vice versa. Voce pode descobrir coisas
importantes nesta conversa.
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