QUERO GIRAR
SEM TEMPO PRA CHEGAR
CHEGAR A TODO TEMPO
E NO TEMPO SEM TEMPO
ME ETERNIZAR
QUERO PARTIR
SEM TER ONDE CHEGAR
SEM LUGAR
TODOS OS LUGARES
HABITAR
QUERO DESEJAR
A FALTA DE DESEJO
SEM DESEJO
DE ABUNDÂNCIA
VIVER
QUERO O PRAZER
E A FALTA DELE
E NESTA DIALÉTICA
QUE ANSEIA O GOZO
UM GOZO SEM ÂNSIA
SENTIR
QUERO MOVIMENTO
QUERO INÉRCIA
QUERO SEGUIR
QUERO FICAR
TUDO
A SEU TEMPO
QUERO SER TEMPO
MEU TEMPO
SEM TEMPO MARCADO
SEM MARCA DE TEMPO
TEMPORÁRIA E ETERNA
O NÓ DA ANSIEDADE
“Venânsia” sempre viveu alguns passos à frente. Muito dinâmica e ativa,
nunca conseguia estar onde estava de fato. “Presente no futuro e ausente no
presente”; era este o lugar que ocupava frente ao tempo. Apesar de ser uma
pessoa realizadora, nunca se sentia assim. Um profundo sentimento de falta
nutria o seu ser. Suas inúmeras conquistas não eram suficientes para lhe dar
preenchimento emocional. Quando realizava um sonho, sua ânsia para viver o
próximo fazia com que não se permitisse usufrui-lo. Tinha sempre que correr em
busca do próximo objetivo a ser conquistado. Conquistar sem usufruir só traz
como saldo um enorme estresse. E, foi a sequencia de um estresse sobre o outro
que foi tornando Venânsia uma pessoa extremamente estressada. Este estresse foi
se tornando crônico e lhe trazendo de presente outras patologias, tais como,
síndrome do pânico, depressão e uma baixa significativa em seu sistema
imunológico. Tomada pelos sintomas desagradáveis destas patologias, Venânsia
era obrigada a parar, frear o seu ritmo acelerado para sentir: sentir seu
corpo, a vida e as pessoas.
Viciada na correria, só se permitia “sentir”
se fosse tomada pela doença que nocauteava seu corpo e a sua mente. E, assim se
acostumou a viver: parando apenas quando era nocauteada por sintomas que não
dava conta de driblar.
Venânsia nunca quis fazer terapia.
Não queria enxergar certas coisas que pudessem frear a sua ânsia de estar à
frente de tudo e de todos. Vinha sempre
à procura de massagem ou outras terapias energéticas. Assim que melhorava,
sumia; e assim que piorava, aparecia. Assim, continuadamente...
Quantas
“Venânsias” tomadas pela ânsia de estar à frente daquilo que precisa ser vivido
e experimentado encontramos pela vida à fora. Muitas "Venânsias" moram, à vezes,
dentro de nós mesmos. Somos viciados naquilo que não temos, por isso, viciamos
no futuro, pois é lá que reside tudo aquilo que nos falta e tudo aquilo que a
nossa ilusão nos promete. De olho no futuro, perdemos nosso foco no presente
para tudo aquilo que nos rodeia, para nossas conquistas e para nossas riquezas.
O medo de perder também reside no futuro. Só tememos perder aquilo que não
perdemos ainda. As nossas perdas reais habitam o nosso presente e diante delas
nada há para ser feito a não ser enfrenta-las com sabedoria. A ansiedade nasce
desta luta insana para ter o que não temos e controlar o que não temos
controle.
Existe
uma ansiedade normal e uma ansiedade patológica. A ansiedade normal nos alerta
sobre algo importante que está por vir para que possamos nos preparar bem no
presente de maneira a transformar o futuro num presente agradável. O presente
não é nada mais que a chegada do futuro. Uma ansiedade saudável nos ajuda a
planejar, a trabalhar de forma preventiva e enfrentar os inúmeros desafios da
vida. Se estivermos com um nível de ansiedade muito baixo, por demais relaxado,
corremos o risco de deixar a vida correr à revelia. A
ansiedade patológica detona na gente o desejo obsessivo de presentificar aqui e
agora um futuro que não pode ainda ser vivido. Nos torna cegos para tudo que
está ao nosso redor e absorto numa avalanche de pensamentos desordenados. É
como se a equação matemática da mente fosse: “Se eu penso, eu controlo, eu
conquisto”. E não: “Viver o que eu conquisto”. Assim vão nascendo as nossas
obsessões. Uma mente ansiosa prepara o terreno para inúmeras patologias, tais
como: TOC (transtorno obsessivo compulsivo), Síndrome do pânico, TAG (Transtorno
de ansiedade generalizada), medos, fobias, etc. A forma e a intensidade dos sintomas
vai variar conforme o transtorno.
Assim
como a ansiedade pode ser deflagrada pelo nosso estilo doentio de vida, ela
pode também ser fruto de desequilíbrios
hormonais, predisposições genéticas, traumas emocionais, ambiente familiar e
social opressor e crenças negativas sobre si mesmo e sobre o mundo.
A
vida cotidiana repleta de cobranças, perigos, competição, pressa e desafios é
um grande deflagrador de ansiedade. Por isso, saber organizar a própria vida é
uma dica indispensável para quem não deseja se tornar vítima de crises da mesma.
No entanto, encontramos um número bem maior de pessoas habilitadas em
desorganizar a própria vida do que o contrário. Muitas vezes, dificultamos o
que pode ser simples e buscamos caminhos estressantes quando poderíamos
caminhar com mais tranquilidade. O desejo de querer mais e mais também nos
torna mais vulneráveis, pois a batalha para ter além da conta detona em nosso
corpo níveis substanciais de adrenalina para enfrentarmos esta luta, muitas
vezes, uma verdadeira guerra.
Para
tratar a ansiedade é necessário descobrir os fatores geradores da mesma e,
sempre como regra, tratar bem da própria vida. A vida foi feita para ser
sentida. Na correria para alcançar o alcançável e o inalcançável passamos pela
vida como um carro em alta velocidade diante da paisagem de uma estrada.
Percebemos e sentimos muito pouco. Falta de percepção e sentido nos deixa
limitados e consequentemente mais inseguro e ansioso. A insegurança é como se
fosse uma voz interior nos dizendo que não daremos conta. Por isso, para “dar
conta” é preciso ter a nossa percepção e os nossos sentidos aguçados. Munidos pela
percepção profunda de nós mesmos e do mundo ao nosso redor nos sentiremos
sempre mais seguros, portanto, menos ansiosos.
Passamos
pelas estações ansiando a próxima. Na primavera nem sempre paramos para
observar as flores. Parar para ver a beleza é perda de tempo para aqueles que
só param para ver o extrato bancário ou para uma internação compulsória. Há
pessoas que nunca assistiram os maiores espetáculos que a Terra nos oferece
gratuitamente todos os dias: o nascer e o por do sol, o nascer da lua. Há quem
raramente olhe para cima para ver a beleza de uma lua cheia. Há quem reclame do
verão desejando o frio e assim que o inverno chega, reclame do mesmo ansiando
pelo verão. Para quem deseja respeitar
as estações da vida, a história de Mangote pode servir de alerta. Mais vale uma
fruta madura e saborosa amanhã do que uma doente e sem sabor hoje. Saber esperar o momento certo é sempre uma boa
medida para medir os níveis saudáveis de ansiedade. Por trás de uma crise de
ansiedade tem quase sempre um medo de esperar e não alcançar. Antes de alcançar qualquer coisa, alcance primeiro a tranquilidade para que a ansiedade não lhe alcance.
O PÉ DE MANGA
Era
uma vez um pé de manga chamado Mangote que vivia infeliz junto com outros pés
de manga, porém felizes, no quintal de uma linda fazenda. Aparentemente,
parecia não existir nenhuma diferença entre os pés de manga que ali viviam, no
entanto, havia uma diferença que era sentida profundamente por aquela árvore
tristonha. Ela era frondosa como todos
as outras, suas folhas bem verdinhas, dava uma sombra magnífica, mas os seus
frutos não eram saborosos. Isso deixava
Mangote muito triste. O maior desejo dele era descobrir a receita que pudesse
deixar os seus frutos tão saborosos quanto os frutos das outras mangueiras.
Certo
dia, absorto em sua melancolia, foi despertado por um João de Barro que
construíra sua casa em seus galhos.
- O que aconteceu
contigo, Mangote? De uns anos pra cá, você anda tão triste...
-Acho que não sirvo
para nada mesmo... Lamentou Mangote.
- Como pode dizer
isto! Voce é minha morada. De tão lindo e aconchegante, escolhi você como minha
morada. Vivo muito feliz com toda minha família graças à sua maravilhosa
hospedagem. Que motivos pode ter para reclamar da vida?
- Voce mora em mim,
mas não saboreia os frutos que eu produzo todos os anos. Prefere as mangas das
árvores vizinhas às minhas . Voce acha que eu nunca reparei nisto? Argumentou
Mangote censurando João de Barro.
- Infelizmente, tenho
que admitir que suas mangas não são tão saborosas como as outras. No entanto,
acho que de nada adianta ficarmos aqui fixados em comparações. Isso só faria
voce se sentir cada vez pior. Admitiu, pesarosamente, o amigo João de Barro.
- E, o que podemos
fazer para mudar esta situação que me aborrece tanto? Perguntou Mangote fazendo
um beicinho como se fosse uma árvore bebê.
- Eu não posso fazer
nada, mas voce, com certeza tem muito que fazer. Respondeu João de Barro.
- Como assim? Eu já
não faço o suficiente? Sou o pé de Manga mais eficaz e rápido deste quintal. Se
voce observar bem, antes mesmo das outras mangueiras florirem, eu já estou
oferecendo fartamente meus frutos.
- Pois, é justamente
aí que voce precisa mudar. Querendo estar à frente de tudo, querendo andar mais
rápido que o próprio tempo, voce se prejudica e não percebe. Alertou o pássaro.
- Ei! Onde é que voce
está querendo chegar? Perguntou, confuso, Mangote.
-Estou querendo chegar
no aqui e no agora. Respondeu com um ar de sabedoria o pássaro inquilino.
- Não estou entendo
nada. Aqui... Agora... Que papo é este? Voce está ficando maluco?
-Quem está maluco já a
um bom tempo é voce, embora não tenha percebido. Quer ser mais rápido que o
tempo, ou seja, que o ciclo natural da vida e acha isto normal. Como pode gerar
mangas normais agindo de forma antinatural? Censurou com delicadeza o amigo
João de Barro.
- Que papo furado é
este, Joãozinho! Retrucou Mangote, mas de forma serena e amiga.
- Furada é a situação
que voce cai nela todo ano por conta desta pressa que não te leva a lugar
nenhum. Pior!.. Te leva a um lugar que voce não quer estar.
- E, onde eu não quero
estar? Perguntou Mangote ironicamente.
- Absorto nesta
tristeza que só aumenta ano após ano. Respondeu com firmeza João de Barro.
- Voce é muito bom pra
criticar. Fala o que eu faço de errado, mas não fala o que é certo fazer. Por
acaso tem alguma receita especial para mim? Sabe adoçar as minhas mangas?
Rebateu criticamente a Mangueira com uma aparente dose de irritação.
- Sei adoçar as suas
mangas sim. Desafiou João de barro.
- Ah! Só me faltava
esta! Se eu que sou uma mangueira não sei como fazer isto; voce como pássaro é
que vai saber? Então, me diga: Qual a receita de mangas docinhas?
- A receita é uma só.
Vale não só para adoçar suas mangas, mas para adoçar a vida de qualquer ser.
Anote aí. Ingrediente – Paciência. Modo
de fazer – Viver o presente.
- O que você está
querendo dizer com isto? Perguntou Mangote após o amigo despertar sua
curiosidade sobre um assunto que parecera ter esquecido.
- Voce se esquece que
uma obra de arte não é feita às pressas. Veja a minha casa, demorei um bom
tempo para construí-la. Tudo é arte nesta vida, inclusive seus frutos. Quantas
vezes você chegou a perder suas flores e, consequentemente, seus frutos por
conta desta postura ansiosa. Faça o que tem de melhor no momento, mas não deixe
que a ilusão de um futuro próspero roube de você o que você tem de melhor hoje;
ou que a desilusão pela crença de um futuro desastroso possa roubar o que tem
de bom aqui e agora. Viva cada estação no seu tempo; mais do que sito, sinta as
peculiaridades de cada estação do ano e da vida.
- Pode ser que tenha
razão... – admitiu Mangote exalando constrangimento. Embora fosse ansioso,
tinha uma qualidade essencial. Não era uma árvore rígida. Era flexível e
humilde. Balançando seus galhos e fazendo suas folhas verdes trepidarem,
continuou: – Vou tentar mudar, embora eu não saiba bem por onde começar.
- Comece freando esta
pressa que só o afasta de si mesmo e de toda beleza que há em ti. Diminua esta
velocidade que lhe impede enxergar, sinta mais o sabor da vida e suas mangas
terão, com certeza, outro sabor. Nesta correria toda, você atropelou o melhor que
existia dentro e fora de ti. Alertou João de Barro.
-Vou tentar, embora eu
não saiba ficar de braços cruzados esperando o tempo passar. Ponderou a
mangueira.
- Deixar a ansiedade
de lado não pressupõe cruzar os braços. Pelo contrário, pressupõe fazer o que
deve ser feito. A dose certa de ansiedade nos impulsiona agir e a esperar
quando o momento exigir. Voce, no entanto, fazia o que não deveria ser feito, pelo menos
em determinados momentos. Afastar a má ansiedade e cultivar a boa, pressupõe
também transformar o que deve e pode ser transformado e aceitar o que não deve
e não pode ser.
- Aceitação... Oh
palavrinha danada de ser vivida! Pensou alto a mangueira que já denotava mais
satisfação.
- Aceite a ação certa
que esta palavrinha se transformará numa benção. Aconselhou o amigo.
Depois
deste dia, muita coisa mudou. Mangote não mudou nada em si mesmo, apenas, sua
postura. Aprendeu a viver o aqui e o agora. Aprendeu a planejar o futuro,
jamais, antecipa-lo e a respeitar as estações. Com esta simples mudança, sua
copa ficava, a cada ano, mais florida e seus frutos cada vez mais docinhos e
saudáveis. Hoje, João de Barro e sua família nem precisam mais das mangas das
árvores vizinhas. Dona Joana de Barro adora fazer com as fartas e deliciosas
mangas de Mangote saborosas mangadas para a passarada. A mangueira infeliz se
transformou, transformando também a sua história que de triste não tem mais
nada.
ESPAÇO DE REFLEXÃO
Quais das características
abaixo tem haver com você? Perceba se algum sofrimento seu no presente tem
haver com tais posturas. Cuide delas, pois elas representam fortes indícios de ansiedade.
( ) Quero maduro o que ainda está verde
( )Quero colher antes do tempo
( )Quero para agora o que é do amanhã
( )Não sei esperar
( ) Desejo apressar a vida, o mundo e as
pessoas
( )Desejo antecipar as estações da vida
( ) Quero ter ao invés de experenciar,
vivenciar
( )Quero muito em pouco tempo
( )Ando muito veloz e não percebo o que está à
minha volta
( )Passo pelas coisas ao invés de vive-las
profundamente
( )Desejo estar à frente. Não aceito o meu
próprio lugar
( )Sou intolerante com a ordem natural das
coisas
( )Meu mundo interior é agitado
( )Estou sempre me adiantando
( )Rejeito o aqui e o agora. Tenho predileção
pelo futuro.
DESAFIO
Passe um dia de sua vida totalmente absorto no
aqui e no agora, ou seja, naquilo que você estiver de fato vivendo no momento.
Não deixe que sua mente lhe conduza para outro lugar que não seja o aqui ou
para outro tempo que não seja o agora.
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