domingo, 30 de dezembro de 2012

NÓ DA FAMA





QUERO NAVEGAR
NESTE MAR DE ESTRELAS.
PUXE A ÂNCORA
CHEGOU A HORA.
SUBMERSO EM MIM,
ESTOU PRONTO PARA SUBIR,
FAZER PARTE DA TRIPULAÇÃO DOS ASTROS,
COMANDAR OS MASTROS
DESTE NAVIO ESTRELAR
QUE NAVEGA SOBRE ESTE MAR DE LUZ.
NÃO QUERO SER A ESTRELA ALFA,
NEM MESMO A MAIS ALTA.
NÃO QUERO SER PIRATA,
LADRÃO DE ESTRELAS,
NEM MESMO MAGNATA.
SÓ QUERO FAZER PARTE
DA TRIPULAÇÃO DOS ASTROS.
BRILHAR, BRILHAR, BRILHAR...
DEPOIS DE NAVEGAR
O INFINITO SEM CESSAR,
DESCANSO PROCURAR.
VOLTANDO COMO ESTRELA
CADENTE E RELUZENTE,
DE LUZ ME ALIMENTAR.
NO MÓBILE ILUMINADO
POR DEUS CONFECCIONADO
SER EU A SUPERESTAR
SHOW CÓSMICO.
SOU CÓSMICO.



O NÓ DA FAMA


O que Humberto mais desejava era ser famoso. Dotado de uma excelente vocação artística, enveredou-se pelo difícil caminho das artes. Entretanto, ser famoso era mais importante do que ser artista e, muitas vezes, esquecia-se de sê-lo, tamanha sua preocupação com os aplausos que ansiava receber. Chegou a receber muitos, mas insuficientes para satisfazer o seu vício pela fama. Mesmo tendo se tornado um artista com reconhecido talento e recebido inúmeras gratificações e premiações neste sentido, Humberto não se sentia satisfeito; um grande vazio preenchia seu peito provocando uma angústia sem fim. Quanto maior a sua obsessão por fama, maior o seu vazio. A vida foi generosa e  lhe deu dinheiro, amores, uma família unida, competência, enfim, o suficiente para qualquer pessoa ser muito feliz. No entanto, Humberto não era como “qualquer pessoa”, era, na verdade, uma pessoa diferente que não se contentava com o suficiente.  A ilusão de que a fama pudesse lhe tornar  uma pessoa melhor só intensificava a sua baixa auto-estima. O desejo doentio de ser famoso devorava o sucesso que já possuía, alimentando, apenas, um incômodo sentimento de falta. Humberto passou dos 60 anos e ainda não se encontrou. Vive procurando algo perdido dentro dele. Ele tem certeza que é a fama que não alcançou ainda. Eu, por outro lado, acho que ele não encontrou o mais importante: “ele mesmo”.

Será que ser famoso é tão prazeroso assim? O prazer da fama pode ser passageiro. A fama em longo prazo pode se tornar um pesadelo. Corre-se o risco de perder a liberdade, a paz, a identidade, passando a ser reconhecido e amado pelo personagem que representa e não pela pessoa que se é. Tornar-se um produto da idealização do outro é extremamente desgastante. Vestir a roupa da perfeição e da idealização para ser valorizado e querido é um ultraje a si mesmo. Travestir-se, escondendo a sua verdadeira essência, pode fazer com que você se perca no labirinto de um ego que se infla a cada elogio e paparicação; um ego doentio que sufoca sua alma.
Para os imaturos, a fama pode se tornar um vício de difícil superação, uma verdadeira droga a qual o sujeito, reduzido à condição de objeto, jamais conseguirá se separar. Os viciados em fama são capazes de se prostituir para manter o seu estrelato. Não me refiro aqui à prostituição do corpo, mas sim, à prostituição da alma, do talento e da verdadeira missão a qual o indivíduo se propunha antes de macular a sua honra em prol do dinheiro e do reconhecimento público.
Sucesso não sustenta os carentes e as vítimas de uma baixa autoestima. Só a fama é capaz de saciá-los. Verdadeiros glutões de reconhecimento, devoram todas as oportunidades de aparecerem em público, por mais indigestas que possam ser estas. Passam, muitas vezes, uma vida inteira admirando a sua própria imagem idealizada e se esquecem de conhecer e curtir aquilo que são realmente. Focados no próprio ego, não conseguem enxergar o próximo. Esta cegueira lhes dificulta ganhar tudo aquilo que o outro poderia oferecer.
Dar conta da fama pressupõe muita maturidade. Ser famoso sem ser sufocado e devorado por um ego faminto e sem ser vampirizado pelos egos alheios é uma tarefa, muitas vezes, penosa. A pessoa famosa encarna o personagem que todos gostariam de viver e que, na verdade, nem ela própria dá conta de ser. É o produto que a sociedade vende num determinado momento. É a fantasia coletiva e, algumas vezes, o desejo de quem não dá conta de si mesmo. Nem sempre a fama anda de mãos dadas com o sucesso. Não raramente, pessoas famosas são mal sucedidas; não é incomum que muitas chegam a desenvolver fortes crises depressivas, meter-se em encrencas e em alguns casos tirar a própria vida. Frente a estas situações, o público assustado e confuso se pergunta: “Como pode acontecer tamanhos infortúnios a uma pessoa tão brilhante?” A resposta é simples: por falta de maturidade, só não conseguiu brilhar para si mesma, afogou-se nas próprias trevas.
Por outro lado, a fama é inevitável para muitas outras pessoas de sucesso. A maturidade é muito importante para que saibam administrá-la não deixando que a fama roube do seu ser o brilho de uma vida plena e livre. Todo vício é uma prisão. Se a fama é um dos seus, esforce-se para separar dele para que você jamais precise se separar daquilo que você realmente é. E, se deseja encontrar o seu verdadeiro brilho, talvez a história abaixo possa ajudar.



O VERDADEIRO BRILHO


Era uma vez um jovem muito rico e bem sucedido. Era um verdadeiro sucesso como ser humano. A única coisa que não possuía era fama, mas, nem por isso, se sentia subtraído, tamanha sua abastança. A sua riqueza só lhe proporcionava mais riqueza e um sentimento de abundância nutria sempre o seu ser. Adorava usufruí-la no enorme supermercado de um belo lugar chamado vida. Ao entrar neste hipermercado, o seu sonho de consumo se concretizava. Pegava o carrinho e dentro do mesmo ia colocando tudo que o seu orçamento lhe permitia adquirir. Sempre escolhia os produtos indispensáveis ao seu precioso desenvolvimento.  Ansiava tornar-se, no futuro, um sábio mestre, sendo, portanto, necessária uma rica dieta de bons sentimentos. Começava sempre pela prateleira do amor, que parecia ser o produto que mais gostava, pois ao encher o carrinho com o mesmo, o seu coração palpitava de emoção só de pensar nos diversos sabores inusitados que experimentaria naquela semana. A paz era, também, um ingrediente que jamais deixava faltar; adorava a sensação que ela ofertava à sua vida assim que era saboreada. Criatividade era o tempero que mais apreciava, já que podia usá-la em vários pratos, até mesmo nos banquetes amorosos. E, assim, ia enchendo o carrinho com muitos outros ingredientes e produtos indispensáveis, cuja falta poderia transformá-lo num desnutrido e medíocre ser, dentre eles: o respeito, a confiança, a liberdade, a verdade, a autenticidade, a alegria, a sabedoria, a determinação, a coragem, a disciplina, honestidade, enfim, muitos outros, todos eles fundamentais ao seu desenvolvimento.
         Certo dia, passando pela ala considerada a mais tentadora do hipermercado, deparou-se com uma prateleira recheada de um produto chamado fama, até então desconhecido para ele. Explorando-o, pensou: _“Talvez ele seja bem saboroso. A propaganda do mesmo é bem tentadora e oferece uma felicidade bem diferente daquela a qual estou acostumado. Esta outra felicidade me parece mais interessante”...
Observando atentamente o rótulo do produto, continuou:
_“A sensação de poder que ele oferece deve ser, com certeza, magnífica. Interessante!...Ele nos oferta um mundo mais colorido do que o mundo em  que vivo”.
O simples fato de acessar este pensamento foi suficiente para que o mundo maravilhoso que vivia fosse, gradativamente, se transformando num cenário sem brilho e sem cor. A fama lhe prometia um mundo repleto de brilhantismo. Desta forma, sem pestanejar, resolveu adquiri-la a todo custo. No entanto, o seu preço era alto. A riqueza que possuía não era suficiente para bancar a posse da mesma. A única solução era abrir mão de muitos produtos, até poucos minutos atrás, indispensáveis em sua vida. Diante daquela propaganda tentadora, começou a pensar que muitos deles talvez não fossem tão importantes assim. Não se deu muito ao trabalho de pensar qual produto seria dispensado para ceder lugar à fama, pois sabia que para adquiri-la teria que abrir mão de quase tudo que possuía. O melhor mesmo era não pensar muito para não correr o risco de desenvolver um conflito de consciência. “Deixar a ilusão comandar é um ótimo recurso para quem não quer enxergar”. Deixar-se ser levado por aquela propaganda maravilhosa, lhe oferecia, naquele momento, maior segurança.  Para não se sentir subtraído e com a consciência pesada, apelou a Deus Pai. Orou e fez diante do mesmo a promessa de que iria experimentá-la a todo custo e que a abnegação de todas as riquezas que tinha anteriormente era, com certeza, uma grande virtude. Chegou a desenvolver a certeza de que Deus Pai desejava vê-lo nutrido por ela. Munido desta crença, sentiu-se mais seguro e certo de estar trilhando o melhor caminho. Abandonou o seu carrinho e levou em suas mãos o leve pote da tão cobiçada fama que viria, futuramente, se tornar pesado demais para quem, um dia, conheceu profundamente a leveza de uma vida plena.
Inicialmente, as primeiras refeições foram, de fato, magníficas e saborosas. Eram verdadeiros banquetes compartilhados apenas com pessoas que valorizavam a sofisticação. No entanto, sofisticação todo dia enjoa. Com o passar do tempo, sentiu saudade do trivial, daquelas refeições básicas e simples. Aquela salada de simplicidade, tão nutritiva, nunca mais foi apreciada pelo seu paladar. Não havia mais tempo para prepará-la. Seu tempo, agora, era todo dedicado a coisas bem complexas. A fama lhe deu em excesso uma coisa chamada dinheiro que usava para adquirir o amor, a paz, a alegria, o respeito, dentre muitos outros alimentos que havia perdido. No entanto, com o uso inadequado do mesmo, o máximo que conseguia adquirir eram produtos falsos ou fora do prazo de validade, que o intoxicavam ao invés de nutri-lo. Paralelamente, foi devorado por um mal estar que transformou a tão desejada fama numa náusea que lhe provocava uma insuportável ressaca na consciência.
O que estava acontecendo? Por que tudo havia se transformado? Perguntas e mais perguntas sem respostas tomavam conta de sua mente, até que um dia resolveu parar para refletir melhor. Parou diante do hipermercado da vida que algum tempo atrás lhe proporcionava tanto prazer. Lembrou dos tempos passados, dos seus carrinhos abarrotados e sentiu saudade. Agora, apenas a fama lhe bastava. Será? Como poderia lhe bastar se estava se sentindo tão vazio? ─ vazio e pesado. Diante de suas divagações, presenciou invejado, saindo do hipermercado, um senhor que aparentava uma felicidade contagiante. Curiosamente, o seu carrinho, além de possuir todos os produtos que tanto valorizou no passado, carregava junto a tão complicada fama. “Esse senhor deve ser muito rico”─ pensou. E, ele ali se sentindo tão pobre! Nunca se sentira assim. Teve coragem de se aproximar para perguntar algo que lhe parecia, até então, praticamente impossível de acontecer. Como um ser humano conseguiria coordenar tudo aquilo em suas refeições? Fama não combinava com tudo aquilo que se encontrava naquele carrinho. Apontando o dedo para o produto que julgava ser a fama, perguntou curioso:
—Como pôde adquiri-la juntamente com todos estes produtos? E como conseguirá prepará-los ao mesmo tempo? Eu não saberia coordenar tudo isto. O senhor além de rico deve ser também muito sábio.
Serenamente, o senhor lhe respondeu:
—Nem sempre é necessário ser rico. Basta ser um bom freguês deste hipermercado da vida, que a gente acaba ganhando o sucesso como brinde.
—Sucesso? Perguntou surpreso.
—Sucesso. Reafirmou o senhor. Por que espantaste tanto?
—Confundi sucesso com  fama.
—De fato, a embalagem é bem parecida, mas o conteúdo é totalmente diferente. Esclareceu o senhor oferecendo-lhe o produto para que pudesse explorá-lo melhor.
O jovem, depois de manuseá-lo bastante, prosseguiu questionando:
—Mas, eu já fui um bom freguês e nunca ganhei o sucesso como brinde.
—Impossível! Todo bom freguês recebe o sucesso como brinde. Provavelmente, não foi paciente o suficiente para esperar as promoções e oportunidades especiais, ou talvez, não tenha dado crédito e nem mesmo enxergado e percebido o sucesso em meio a tudo que possuía.
—Mas, por que eu teria ficado tão cego assim?
—O desejo de ter brilho em excesso, muitas vezes, ofusca os nossos olhos. Elucidou o senhor que parecia mais um sábio fazendo uma leitura da alma daquele jovem.
—Preciso então aprender a enxergar.
—Enxergar o sucesso e tirar as vendas que a fama colocou em seus olhos. É preciso ter cuidado com ela. Muitos ficam cegos mesmo antes de adquiri-la. Só o desejo de tê-la já tira de muitos a capacidade de enxergar e valorizar aquilo que se tem.
—O senhor tem razão. Mas, será que eu conseguiria viver agora sem ela?
—Só você poderá avaliar isto. Não conseguiria viver feliz sem ela?
—Eu já vivi, mas depois que conheci a propaganda deste produto parece que me viciei nele. Fiquei, de certa forma, obcecado pela ideia de possuí-lo. Possuindo-o, me perdi. Não era bem este sabor que eu buscava, apesar de ter me viciado nele.
Aquele sábio senhor tentando consolá-lo e estimulá-lo a redirecionar sua vida, ofereceu ao mesmo algumas proposições pessoais:
—Eu, particularmente, me sustento com o sucesso. Não preciso do mundo babando aos meus pés para sentir-me talentoso.
—Mas, ninguém vive só de talento. Precisamos do dinheiro para viver, e ele me é dado através da fama que conquistei. Contestou o jovem.
—E desde quando só conseguimos dinheiro adquirindo fama?
—Eu sou um artista, e não há como um artista ganhar dinheiro sem ser famoso.
—Isto é muito relativo. Depende muito da quantidade de dinheiro que você quer ganhar e da forma como você deseja expressar o seu talento para o mundo.
Obstinado pelo dinheiro e pela fama o jovem continuou. Parecia não conseguir ouvir muito bem o precioso ensinamento contido nas entrelinhas do discurso daquele sábio senhor.
—Como uma pessoa pode ganhar dinheiro sem ter a fama como sua aliada?
—Conheço muitas que ganham. Conquistam estabilidade, não são conhecidas pelo mundo, mas são reconhecidas em seu mundo. Basta ampliarmos cada vez mais o nosso espaço de atuação. Ampliando-o, o nosso reconhecimento vai ficando cada vez maior.  Mesmo que não nos tornemos um fenômeno, tornaremos, no mínimo, uma pessoa muito especial para aquelas pessoas que realmente vale à pena ser especial. É neste momento que o sucesso se torna inevitável.
—Como é que se amplia o próprio espaço? Perguntou o jovem.
—Aliando-se ao trabalho. E, o verdadeiro trabalho exige amor, vocação, determinação, disciplina, confiança, respeito, liberdade, criatividade, coragem e honestidade, acima de tudo.
—Dá para explicar isto melhor?
—Com certeza! Primeiro, é necessário amarmos aquilo que fazemos para desejarmos, no fundo de nossa alma, investirmos no caminho que nos propusemos seguir. Amando, a gente se dispõe a enfrentar todas as dificuldades, até mesmo a falta de dinheiro e ausência de fama. Com todo este amor, cultivamos a determinação de seguir em frente e não desistir diante das dificuldades que, com certeza, surgirão para nos colocar à prova, ou seja, para nos certificarmos que estamos mesmo no caminho certo. Se continuarmos seguindo, mesmo diante delas, é porque este é realmente o nosso caminho. Determinados, criamos a disciplina necessária para coordenar os nossos esforços e não perdermos tanta energia. Com isso, vamos ganhando confiança e a credibilidade de que seremos capazes de transpor obstáculos cada vez maiores. Passamos, então, a nos respeitar mais, pois enxergamos o quanto somos dedicados e esforçados. Neste momento, começamos a nos sentir um sucesso para com a gente mesmo e para com as pessoas mais próximas que acompanham o nosso dinamismo. Os aplausos virão muito mais de dentro do nosso coração do que dos grandes teatros que existem fora da gente. As pessoas que nos amam, que nos conhecem um pouquinho mais, também nos aplaudirá. Poderemos até nos sentir um pouquinho vaidosos, uma vaidade, até certo ponto, gostosa de sentir. Só precisamos tomar cuidado para não deixar que ela cresça demais, a ponto de ansiar pela fama e não se sustentar mais com todo o sucesso que teremos adquirido. Tomando estes cuidados, seguiremos em frente com a nossa dedicação e esforço. Às vezes, poderemos nos sentir um pouco cansados. Com isso, passaremos a respeitar não só a nossa potencialidade diante da vida, mas também os nossos limites. Iremos adquirir a sabedoria de que precisamos nos poupar para não perdermos a tão preciosa energia que nos mantêm vivos e capazes de trabalhar.  Perceberemos que somos livres para nos doar a vida ou a morte. E, se nos respeitarmos, optaremos, inevitavelmente, pela vida. De posse da liberdade e da confiança em nós, desejaremos ser criativos para que possamos expressar a nossa mais profunda autenticidade. Para sermos autênticos é fundamental ter muita coragem. Coragem para criar o nosso próprio produto ao invés de nos transformar num mero produto massificado pelos interesses de quem tem fome de poder. Aliás, neste momento, muitos se prostituem para obter a fama a todo custo.  Quem não se prostitui, toma consciência daquilo que se é realmente, não se permite jamais ser desonesto consigo ou com o outro. Automaticamente, toma conhecimento de uma lei que jamais falha.
Antes que o sábio senhor pudesse prosseguir, o jovem perguntou exalando curiosidade:
—Qual?
—A lei da ação e reação. “Toda ação tem uma reação igual e contrária. “Conscientes, jamais seremos capazes de fazer mal ao outro e nem mesmo a nós mesmos para conquistar os nossos objetivos. Talvez, neste momento, a gente cumpra fielmente a nossa missão nesta vida. E, algum dia, quando formos desapropriados de toda a matéria que nos foi emprestada, poderemos, finalmente, apropriarmos da verdadeira luz e brilho que sempre sonhamos e que cultivamos ao longo de nossa vida. Por isso, as crianças acreditam que viramos estrela quando partimos. Creio que esta seja a única estrela que realmente valha à pena se transformar.
—Acho que entendi. Parece-me que adquiri a mercadoria errada nos últimos anos. Inicialmente, estava indo pelo caminho certo, mas diante da primeira provação abandonei o meu carrinho. Preciso me apropriar de tudo que abandonei.
Finalmente, aquele jovem pareceu ter ouvido a voz do seu coração. Quando estamos surdos para ele, os nossos anjos se utilizam da voz de outros seres para que o nosso coração possa falar através deles. Até então, aquele jovem amordaçava a sua alma ouvindo apenas   o que o seu inflado ego ansiava e ditava. Com muita ternura em seu olhar e dando as mãos para uma criança assustada e abandonada dentro de si, olhou, finalmente, para o sábio senhor e disse:
—Quando eu crescer quero ser como o senhor.
O jovem continuou a sua caminhada buscando agora uma nova rota. Não buscou mais o sabor que o mundo de brilhantismo determinava, mas sim o sabor do mundo que o seu brilho interior necessitava para jamais se ofuscar



ESPAÇO DE REFLEXÃO



Será que você é daqueles que confunde fama com sucesso?  Se deseja o sucesso, viver conforme as diretrizes abaixo pode lhe trazer alguns problemas. No entanto, se busca a fama, não há nada de errado em se posicionar assim. É bom  lembrar que não é certo e nem mesmo errado buscar o sucesso ou a fama. A diferença reside apenas no preço que se quer pagar por cada um.


(  ) Desejo ser o centro das atenções
(  ) A simplicidade me incomoda
(  ) Abro mão da minha privacidade
(  ) Quero ser notícia
(  ) A tranquilidade me entedia
(  ) Quero agitação
(  ) “Aparecer” é o meu lema
(  ) Sou mais atraído pela superficialidade
(  )Fanatismo me dá prazer
(  ) Quero ser um ídolo, não me basta ser uma pessoa comum
(  ) Quero ser desejado e admirado por todos
(  ) Desejo ser invejado
(  ) Fico frustrado quando sou apenas valorizado; preciso ser supervalorizado
(  ) O mais importante não é o significado de minha obra, mas o brilho que ela pode  alcançar
(  ) Me sinto importante apenas quando sou bajulado e paparicado
(  ) A minha imagem é mais importante do que aquilo que sou, de fato
(  ) Quero ser um ídolo para jamais correr o risco de ser esquecido
(  ) Não me basta ser amado, preciso ser venerado
(  ) Meço o meu poder pelo grau de paixão que deixa o outro cego por mim


DESAFIO


Ser famoso sem perder a essência. Ter brilho sem ofuscar a sua visão. Ser amado sem precisar da veneração. Ser você mesmo e vestir uma roupa que caiba a sua alma. A fama sustentada por estes alicerces não abala estruturas.

domingo, 25 de novembro de 2012

O NÓ DO DESCOMPROMISSO




COMPROMISSO É COISA PESADA
HOJE EM DIA, ULTRAPASSADA
NO ENTANTO...
MARCO E NÃO VOU
FICO MARCADO
FALO E NÃO CUMPRO
FICO FALADO
MELHOR SERIA
SER COMPROMISSADO?
EMBORA COMPROMISSO
 ME FAÇA SENTIR ASSIM
COMPLETAMENTE ENGESSADO
DEVO ADMITIR SEM RODEIOS
QUE LIBERDADE SEM COMPROMISSO
NÃO É LEVEZA OU SAUDÁVEL ESPERTEZA
É ALIENAÇÃO
E DECEPÇÃO, COM CERTEZA




O NÓ DO DESCOMPROMISSSO


Jovelino era um rapaz jovem com grande dificuldade de amadurecer.  Apesar dos seus 23 anos, se comportava como um adolescente. Seu pensamento estava sempre voltado para os prazeres que poderia não só usufruir da vida, mas  também usurpar da mesma. Não ajudava e não colaborava com nada em casa. Aliás, era extremamente desorganizado e  o que sabia fazer com maestria era criar bagunça para o outro arrumar. Inflava-se de pedantismo para dizer que não era empregada doméstica para fazer certos tipos de serviço ou, no mínimo, que as atividades domésticas lhe davam arrepios.  Esta justificativa infantil era o suficiente para a mãe assumir todas as responsabilidades neste setor, visto que a família não contava com os serviços de uma empregada. Mesmo assim, a mãe aceitava esta atitude infantil do filho, alimentando-o com esta dependência. Agindo assim, talvez quisesse, inconscientemente, ter para si uma eterna criança. Jovelino não se ligava  nas responsabilidades que esta nova etapa da vida exigia e possuia pais que alimentam o seu lado criança. Não se comprometia com nada que dissesse respeito a uma vida adulta. Criava profissões ilusórias em sua cabeça que pudessem garantir  o status e a continuidade dos prazeres que não aceitava  abrir mão, tais como, dinheiro acessível para suprir todos os seus desejos, por mais banais que pudessem ser. Jovelino, apesar de adulto,  dava como toda criança birrenta os seus pitis quando os pais tentavam impor  algum limite que pudesse frustra-lo. Acreditava que os pais deviam suprir todos seus caprichos. Tinha sempre uma frase pronta para justificar sua demanda de caprichos: “Eu não pedi para vir ao mundo!” Jovelino não assumia a própria vida. Achava que o fato de ter sido gerado pelos pais, o eximia da responsabilidade de comprometer-se com a sua própria vida. Todo ano tentava vestibular para  medicina ou direito. Seu intuito era ser prontamente, como num passe de mágica, um médico famoso ou um juiz poderoso. De acordo com suas fantasias, se  formaria numa escola Federal que lhe daria um maior status intelectual. No entanto, nunca se empenhou ou estudou o suficiente para passar numa escola assim. Depois de tantos fracassos sempre justificados, colocando a culpa em alguma situação ou pessoa, resolveu tentar o vestibular numa escola particular. Em nosso país há muitas escolas para Jovelinos.  Fico pensando: Quem serão os clientes destes jovens sem compromisso com a realidade? Quem serão as vítimas de suas fantasias e de seus delírios?Que Deus nos proteja  deles, ou que nos dê,  no mínimo, a intuição e discernimento para separamos  o joio do trigo.


Os Jovelinos da vida são verdadeiros sanguessugas, mas todo parasita tem um hospedeiro que se permite ser sugado. Será que voce é hospedeiro de algum Jovelino? Se for, há duas alternativas plausíveis para  sua  condição: Ou voce adora ser a vítima ou deseja fazer do Jovelino a sua vítima, tornando-o dependente de sua boa vontade para que voce possa reinar, dominar sutilmente, e ainda assim, receber o título  de pessoa bem intencionada.
Colocar limites para os Jovelinos é a única maneira de faze-los crescer e a única  maneira de protegermos a nossa vida, bem como a sociedade do estresse e da ameaça  que eles representam. Querem tudo sem dar nada em troca. A desorganização de qualquer grupo social, seja ele, o lar, a escola, ou a comunidade de uma forma geral, é decorrente da atuação de algum Jovelino e de  seus respectivos hospedeiros.
 Nada funciona harmonicamente sem a reciprocidade mútua. Jovelinos desconhecem o significado das palavras reciprocidade, solidariedade, colaboração e compromisso. São extremamente egocêntricos, portanto, incapazes de enxergar e respeitar o território do outro. Para eles, ha um único território: o próprio. Neste território, mandam e desmandam, reinam sem restrições. Para Jovelinos só existem direitos. Dever é uma palavra que existe, no entanto, só para o outro. Todas as vezes que seus desejos  são contrariados, pousam de vítimas ou assumem uma postura muito agressiva para lutar por aquilo que, ilusoriamente, acreditam ser também um direito seu, inalienável. Jovelinos  não conquistam nada. Tudo que adquirem, é,  de certa forma, uma usurpação. Se investigarmos bem, por trás de uma falsa luta para conquistar um objetivo tem sempre alguém explorado por ele, e, na  verdade,  o maior responsável por sua conquista. Se não encontrar um explorado, encontrará alguém que lhe dê tudo na bandeja, alimentando a sua aspiração de ser alguém sem nada precisar dar em troca. Este ser que banca o egocentrismo dos Jovelinos também almeja alguma realização. Encontramos aí, o tradicional desejo de pais medíocres que se sentem realizados se puderem apresentar para a sociedade os títulos de seus filhos.  Para isto, são coniventes com todo tipo de falcatrua e mediocridade que possa oferecer ao seu rebento o diploma de bem sucedido. Muitos são, também, “pais Jovelinos”,  que não  oferecem limites por não darem conta de aceita-los. Vivem através dos filhos a sua própria falta de limites. No reino do egocentrismo destes Jovelinos não há espaço para o compromisso germinar. Compromisso requer empatia, virtude desconhecida para os Jovelinos que possuem muita dificuldade de se colocar no lugar do outro, pois reconhecem apenas o lugar de seus próprios desejos.
Grande parte das coisas que não são realizadas no mundo se deve à ação descompromissada dos Jovelinos. São como gafanhotos que nunca chegam na hora de semear, mas que sabem devorar como ninguém. No entanto, para toda praga tem um remédio: Limite é uma boa medicação  para quem deseja tratar de Jovelinos ou se proteger deles.  
Muitas vezes somos Jovelinos com a nossa própria vida. Não temos compromisso com nossos objetivos, com nossos sonhos, com nossa saúde, enfim com tudo de mais sagrado que nos rodeia  e que é, de certa forma, o diamante de nossa vida. Se perdemos este diamante, perdemos o nosso brilho. Quando não temos compromisso com nós mesmos, falta também limites em alguma área de nossa vida. Por excesso de ambição, não enxergamos, muitas vezes, a nossa verdadeira missão como ser humano ou a importância de nossa saúde. Embrenhamos, sem limites, num mundo que nos distancia da nossa verdadeira essência. Enxergamos, apenas, o desejo de um ego faminto sem ouvir as necessidades de nossa alma. Criamos o caus e o desequilíbrio dentro de nós mesmos, embora, na maioria das vezes, relutemos em admitir isto.
Quantas vezes somos Jovelinos com a natureza. Aliás, a atitude “jovelínica” do homem, vem destruindo o que não tivemos trabalho de semear. Queremos devorar, desmedidamente aquilo que nos sustenta. No entanto, a mãe natureza não age como pais de Jovelinos. Ela já está colocando limites, embora, relutemos em aceitar. E, cada vez mais, os limites serão mais rígidos, pois a natureza sabe, como ninguém, educar. Quando promete, não volta atrás. E, lamentavelmente, lá na frente, não haverá retorno. Melhor seria tomarmos consciência agora, mas a população de Jovelinos tem crescido mais do que enxame de gafanhotos na lavoura do bom senso.
A palavra compromisso deriva de “com promessa.” Tem muita gente avessa a esta prática. Observo que a grande maioria avessa ao compromisso, exige esta prática do outro, menos de si mesmo. Quando fazemos um acordo ou uma promessa, estamos acordando o que ganhar e o que perder; estamos acordando direitos e deveres. Há quem queira pagar sua falta de compromisso com palavras de desculpas ou com justificativas que giram apenas em torno de suas próprias necessidades. Há quem nem mesmo isto ofereça. Consciência é o que lhes falta. São portadores de uma pseudo consciência que lhes permite enxergar apenas os seus próprios propósitos.
 Existem pessoas que sentem a palavra compromisso como uma gaiola ou como um engessamento. Temendo um aprisionamento, fogem desta prática, mas acabam se perdendo, pois não há como não se comprometer. Comprometemo-nos até mesmo com a nossa falta de compromisso. É possível evitar certos compromissos, mas não todos. O nosso corpo e a nossa alma estão repletos de exigências. Somos seres sociais e a sociedade, o trabalho e família também nos exigem compromissos. Em tudo que fazemos ou deixamos de fazer está implícito algum nível de comprometimento.
 Não há como viver isoladamente. A nossa interdependência para com tudo e todos nos exige comprometimento. Pessoas maduras são pessoas compromissadas. Pessoas imaturas vivem a seguinte operação: “Compromisso, só para o outro”. Aprisionam-se no princípio do prazer: “Prazer, só meu”.
Não é possível ter o mesmo nível de compromisso com tudo e com todos. Em momentos diferentes da vida selecionamos o que teremos mais ou menos comprometimento. O importante é cumprirmos fielmente o nível de compromisso que acordamos ter com determinadas causas do momento.
O imaturo finge ter compromisso para levar vantagem sobre a pessoa ou situação com a qual se compromete. Um ser maduro não se compromete quando não pode oferecer o que lhe é solicitado. Sabe medir bem o grau das exigências solicitadas e a sua disponibilidade para cumpri-las. Pessoas avarentas, que desejam levar vantagem em tudo, não possuem medidas. A ausência de limites é a principal medida destas pessoas.
Nas filosofias indianas existe uma palavra muito importante chamada Dharma = dever, nossa missão e nosso compromisso nesta vida. Se não cumprirmos e respeitarmos o nosso Dharma geramos desequilíbrios significativos não só na nossa vida, mas na nossa sociedade e no universo. Toda Dharma implica num Karma. No Karma prevalece a lei da ação e reação. “Toda ação tem uma reação igual e contrária”. Se não respeito meu Dharma crio um karma desfavorável. Podemos perceber claramente esta operação em nossa vida e na nossa sociedade citando uma variedade de exemplos – políticos que não cumprem seu dever gerando desequilíbrios sociais significativos; pais que não cumprem seu dever para com os filhos gerando desequilíbrios emocionais marcantes na vida dos mesmos; nosso desvelo com nosso corpo gerando sérias doenças; empregados ou patrões que não se comprometem mutuamente um com o outro acabam gerando a falência de uma empresa e por aí vai...
Todas as vezes que desejamos ser alguma coisa, precisamos primeiro analisar se além do desejo queremos nos comprometer com as tarefas que esta missão de “ser” nos solicita. A vida não se sustenta apenas com desejos, mas com ações. É através de nossas ações que cumprimos o nosso dharma e criamos um karma que promova a nossa evolução. A grande maioria das complicações que vivemos são frutos do desrespeito ao nosso dharma, ou seja, ao nosso dever e compromisso. Cumpra bem o seu dharma, o seu compromisso e verá mudanças positivas operando em sua vida. Se tua vida está muito desorganizada e desequilibrada é porque você não está cumprindo o seu dharma ou está sendo conivente ou sustentando a falta de compromisso de alguém.
Para quem deseja ter um pouquinho mais de compromisso com o mundo, com o outro e consigo próprio  e aprender a se defender de quem não possui um nível satisfatório de comprometimento, a história de Fofura, uma baleia de alma faminta, talvez possa alertar para algumas coisas importantes.
                                   
        
A Baleia de alma faminta


Na imensidão do mar vivia Fofura, uma baleia muito simpática e bonita. Todos amavam Fofura, menos ele mesmo. Por isso, vivia sempre triste achando que alguma coisa lhe faltava. Mesmo sendo agraciado pela riqueza imensurável do oceano, se portava como um ser miserável. Se achava vítima de uma vida sem graça. Sentindo-se assim, Fofura foi perdendo o encanto, ficando cada vez mais desanimado e solitário. A única coisa que Fofura  gostava de fazer é comer, comer, comer... Mesmo que não estivesse com fome, devorava, instantaneamente, qualquer alimento que cruzasse o seu caminho. Sabem por que ?Porque existia uma fome na alma de Fofura proveniente das coisas boas da vida que ele deixou de se alimentar.  Amargurado, se isolou e deixou de ser nutrido pelo carinho dos amigos e familiares. Sentia-se rejeitado e ressentido. Seu ressentimento lhe provocava imenso mal estar.  Passava a maior parte do tempo dormindo, dormindo, dormindo...Seu desânimo impedia que fosse nutrido pelo lazer e por todas as festas maravilhosas promovidas pelos seres marítimos. Fofura perdeu a vontade de participar de tudo que pudesse alimentar sua alma. Um ser com a alma alimentada não possui  o desejo de entupir o corpo com excessos capazes de adoecê-lo. Infelizmente a alma de Fofura estava desnutrida e ele foi usando seu corpo para compensar aquilo que faltava em sua vida. Ingeria tudo que pudesse fazer com que sentisse cheio, jamais satisfeito. Foi assim que foi se tornando uma baleia muito pesada. Perdeu a leveza e já não conseguia mais nadar como antes. Passava a maior parte do tempo parado, sustentando uma depressão horrível, agora, sua maior companheira. Depressão é uma doença séria que toma conta  da gente todas as vezes que a gente se esquece de tomar conta da nossa própria vida. Infelizmente, nem todo mundo sabe como tomar conta da própria vida; faz isto de uma forma muito equivocada.  Afogando cada vez mais em um mundo de trevas, Fofura perdeu a vontade de viver, pois aquela vida já não tinha mais graça. Só uma mudança bem grande poderia salvar Fofura, no entanto, ele tinha a preguiça como a sua maior aliada e só a palavra mudança já lhe dava arrepios.
Fofura só sabia reclamar e solicitar coisas que não preenchiam  a sua vida. Posava de vítima de uma vida chata e não assumia a responsabilidade pelas suas frustrações. Atribuía sempre a alguém esta responsabilidade.  
Muitos amigos se aproximavam de Fofura ofertando conselhos que poderiam ajuda-lo muito, mas ele não tinha a menor vontade de colocar em prática os conselhos que recebia. E, assim, os amigos acabaram se afastando dele, pois aquela baleia, no passado tão amigável, se tornou fria e distante. Mas, tem sempre aquele amigo que nunca desiste da gente. E, Fofura tinha um amigo deste.
Tuba era um tubarão muito determinado e resolveu ajudar o amigo. Percebeu que lá no fundo dos olhos de Fofura ainda existia uma centelha luz e um possível desejo de viver uma vida feliz. Resolveu investir nesta possibilidade. Forçando-o, pegou Fofura pelas nadadeiras e o  levou até Netuno, o grande Deus dos mares. Sabia que só a sabedoria de um Deus poderia dar um jeito em Fofura. Meio a contragosto, Fofura seguiu com Juba para a grande caverna de Netuno. Sentado num trono formado por corais da mais inusitada beleza, o grande Deus dos mares iniciou a conversa:
- Finalmente! Estou lhe esperando já faz um bom tempo, Fofura.
- Como assim? Perguntou Fofura sem compreender a razão que levava Netuno esperar por ele. Se achava uma baleia insignificante, jamais um presente dos Deuses para o universo. 
Antes que Netuno lhe desse a resposta. Tuba cochichou no seu ouvido:
- Netuno é o grande Deus e sabe de tudo que acontece com todos os seres marítimos e em cada centímetro do oceano. Com certeza, sabe muito bem o que você anda fazendo consigo mesmo.
- Como assim, pergunto eu! Continuou Netuno dando prosseguimento à indagação de Fofura – Voce acha que pode deixar de se comprometer e as coisas permanecerem em ordem?
-Comprometer? Não estou entendendo onde o senhor deseja chegar... Indagou Fofura.
- Quero chegar na palavra compromisso. Sem ele, as melhores energias do nosso universo não se sustentam. Não há como existir amor, saúde, trabalho, felicidade e evolução sem compromisso. Por acaso, você se esqueceu do significado mais profundo desta palavra?
Antes que Fofura pudesse responder, Tuba, respondeu por ele:
- Com certeza, esqueceu. Se não tivesse esquecido não estaria assim.
- Parece que você não se esqueceu; não é mesmo, Tuba? Se tivesse se esquecido do compromisso que devemos ter com tudo aquilo que nos cativa e  cativamos, você teria deixado esta amizade morrer. 
Sem palavras, Tuba moveu a cabeça afirmativamente respondendo com um afetuoso sorriso e com um olhar que denotava um profundo carinho pelo amigo. Netuno levantou-se de seu trono e como se fosse uma espada, apontou seu olhar para Fofura ,  olhar ainda mais profundo do que o de Tuba, mas que denotava uma certa firmeza e acusação. Com uma voz empostada, indagou a baleia:
- E você, o que me diz?
Fofura, sem saber o que dizer, limitou-se a baixar seu olhar num gesto de total submissão ao grande Deus. Netuno, com uma voz ainda mais firme perguntou franzindo a testa:
- Voce quer  ser um peso  ou uma promessa de felicidade para o nosso mundo?
- É claro que eu desejo ser uma promessa de felicidade. No entanto, eu não sei como fazer isto.  Respondeu Fofura rompendo com seu silêncio angustiante.
- Voce não tem que desejar nada!  Desejos você já tem demais. Tem que querer fazer efetivamente alguma coisa. Entre o desejo e a vontade existe um grande abismo. E, parece que é nele que você caiu.
- Como assim? Não entendi. O senhor pode me explicar melhor? Solicitou Fofura ao Grande Deus dos mares.
- Desejar é fácil. Quero ver você  se comprometer  a fazer aquilo que o seu desejo lhe solicita fazer.
-E, o que o meu desejo me solicita fazer? Estou tão perdido que nem sei mais o que desejo.
- Muito menos o que quer, não é mesmo? Ironizou Netuno.
Meio sem jeito, Fofura balançou a cabeça afirmativamente. Quando abriu a boca para pedir desculpas, foi interrompido por Netuno:
- Já sei o que vai falar. Vai pedir desculpas. Desculpas é tudo que os descompromissados sabem fazer. Fazer não, falar. Gente sem compromisso é bom de lábia, porém, incapaz de agir com decência.
- Está me dizendo que ajo com indecência? Questionou Fofura assustado e ao mesmo tempo recriminando Netuno com um olhar insatisfeito.
- Ah! Está insatisfeito comigo? Está insatisfeito com as verdades que lhe digo? Ou está insatisfeito consigo mesmo? Inqueriu Netuno.
- Na qualidade de Deus, o senhor deveria me ajudar e não ficar aí me acusando. Recriminou novamente Fofura.
Netuno deu uma estridente risada rachando alguns corais mais frágeis próximos a eles.
- Ah, é! Eu é que deveria estar fazendo alguma coisa por você... E, o que cabe a você fazer por si mesmo? Não estou cobrando de você fazer pelo nosso mundo. Isto seria demais para você agora!  No momento, estou cobrando de você fazer apenas por si mesmo, pelo seu mundinho.  Mas, nem pelo seu mundo pequeno você se compromete, sua baleia egocêntrica. Repreendeu Netuno.
- Egocêntrica? O que é isto? Perguntou Fofura franzindo a testa.
- Egocêntrico é aquele ser que gira apenas em torno dele mesmo. Não consegue ter compromisso com nada e nem mesmo com ninguém. Não tem compromisso nem mesmo consigo próprio. Quer que o mundo tenha este compromisso por ele. Cobra do mundo o que deveria cobrar de si mesmo. Não faz e quer receber. Quer ter direitos; deveres jamais. Rompe acordos e não deseja pagar por isto.  Explicou pausadamente o grande Deus.
- Mas, que acordo eu não venho cumprindo? Perguntou Fofura querendo passar um ar de ingenuidade.
- Muitos! Centenas deles. Pare de fingir ingenuidade!  Voce sabe muito bem o que está deixando de fazer. Esta carinha de ingênuo só engana a si mesmo, à mim, jamais!
- Mas, eu... Antes que pudesse continuar, o grande Deus retomou o assunto.
- Mas, eu o que? Pare de  buscar desculpas esfarrapadas para seus gestos irresponsáveis. Aliás, o que os seres sem compromisso mais possuem são desculpas esfarrapadas. Sempre arranjam desculpas para justificar o que não tem justificativa e negar seu vergonhoso egocentrismo. Suas justificativas atuam como uma burca para esconder uma face vergonhosa que nem mesmo eles dão conta de olhar e conviver.
- Poxa! Voce está pegando pesado demais comigo, grande Deus. Reclamou Fofura com os olhos lacrimejando.
- Pesado está você! Daqui uns tempos, você não se meche mais. Não tem compromisso com seu corpo e nem com sua própria vida. Diga lá, com os seus amigos, familiares e outros seres que cruzam o seu caminho.
- Por favor, me diga então o que devo fazer. Implorou Fofura.
- Não vou lhe dizer nada! Como já disse anteriormente, o maior defeito dos descompromissados é perguntar o que fazer ao invés de fazer o que deve ser feito. Voce sabe muito bem o que fazer. O acordo já foi firmado. Voce, simplesmente, não anda cumprindo o seu dever. Quer direitos, direitos, direitos... E, não faz nada direito. Se quer saber de alguma coisa agora, pergunte para sua consciência. E, por hoje, a nossa sessão acabou! Finalizou Netuno.
Tuba, boquiaberto ouvia tudo atentamente. Sem dar uma palavra, pegou novamente o amigo pelas nadadeiras retirando-o dos aposentos do grande Deus. Levou Fofura para a praça de corais mais próxima, recostaram-se sobre uma linda rocha para refletir sobre o resultado do encontro. Fofura, ainda insatisfeito e exalando irritação, resolveu usar o amigo Tuba para tecer as suas viciantes justificativas de “meia tigela”. 
- Netuno é muito radical! Não entende nada que se passa comigo e com ninguém. Voce não tinha que me trazer aqui! Voce é culpado por eu estar agora mais insatisfeito ainda. Se fosse meu amigo, teria me defendido frente as sérias acusações que aquele Deus de araque me ofertou.
Tuba não acreditou no que acabara de ouvir.  Ficou ainda mais perplexo com o amigo. Comprometendo-se com a saúde e felicidade do mesmo, acabou recebendo de volta sua ira ao invés de sua gratidão. Tuba compreendeu que seres egocêntricos e sem compromisso jamais conseguirão olhar para o outro. Olham apenas para si mesmo e mesmo assim não conseguem se enxergar. Enxergam apenas a ilusão daquilo que julgam ser. Compreendeu que o único compromisso que Fofura possuía era com a mal que lhe habitava; por isso, conseguia fazer tão bem o mal a si mesmo. Bateu nas costas do amigo e falou pesarosamente:
- Sinto muito! Muito mesmo! O meu compromisso com você acaba aqui. Não existe compromisso unilateral. Talvez, esta seja a mensagem mais importante que o grande Deus Netuno lhe passou. Não temos como exigir de Deus, dos amigos, familiares, enfim do mundo aquilo que não fazemos por nós mesmos. Não vou desejar a você que fique com Deus, pois você só dá conta de ficar consigo mesmo e com este mal que lhe habita. Deixe-me afastar antes que este seu mal me atinja também. Meu grande amigo Fofura, de Fofura não tem mais nada. Só vejo dureza; e Dureza será seu nome daqui para frente.
Tuba partiu sem olhar para trás e Fofura ficou ali, parado e duro, à espera de algo que ninguém jamais faria por ele. O tempo passou e ninguém mais e lembrou da existência de Fofura. Ficou esquecido; simplesmente, esquecido. Esquecido, primeiro, por ele mesmo e depois pelo resto. A única lembrança que restou foi de uma baleia chamada Dureza. De tão dura que era virou uma pedra. Esta pedra,  no centro de uma praça, se transformou num altar  onde milhares de peixes vinham ofertar suas oferendas pelas promessas  realizadas. Dizem que o Deus Netuno é capaz de perdoar tudo, menos uma promessa não cumprida. E, como a palavra compromisso provem de “com promessa”, todo ser sem compromisso,  parecido com Fofura, acaba um dia virando pedra – pedra que machuca ou pedra no sapato da gente. E, para não se machucar com esta perigosa e desconfortante pedra, melhor atira-la para bem longe da gente.


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