quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O NÓ DO DESPREZO


FALO BRASILEIRO

MUITO MAL O PORTUGUÊS

FALO ESTRANGEIRO

E ESQUEÇO O RESTO

ESQUECIDO DO QUE SOU

I’ DON’T KNOW MAIS NADA


BRASILEIRO CAIPIRA

PORTUGUÊS ULTRAPASSADO

ESTRANGEIRO CHIQUE

OH MAY GOD

QUE LOUCURA!

HELP!


LÍNGUA BRASILEIRA

LÍNGUA PORTUGUESA

LÍNGUA ESTRANGEIRA

SÃO TANTAS AS LÍNGUAS NUMA SÓ

QUE JÁ NÃO SEI MAIS

QUAL A MINHA


FALE BEM O INGLÊS

OU CHERAP

MAL O PORTUGUÊS

E CALE A BOCA

O BRASILEIRO PARA O GASTO

PSIU!


COMO HAMBURGER

CAGO SANDUÍCHE

DELICIO RUFFLES

VOMITO BATATAS

ALIMENTO-ME COM HOT DOG

ARROTO CACHORRO QUENTE


INTERVALO PARA COFFE-BRACKE

PARADA PARA O LANCHE

SALE PARA OS RICOS

LIQUIDAÇÃO PARA OS POBRES

MERCHENDAIZE PARA SOCITE

PROPAGANDA PRA RALÉ



RESIDO-ME EM LOFT

ABRIGO-ME EM APARTAMENTO

ROUPAS NO CLOSET

BUGIGANGAS NO ARMÁRIO

BANHO-ME NA SWITE

DEFECO NO BANHEIRO


EXPONHO BANERS

PENDURO CARTAZES

ENVIO FOLDERS

ESPALHO FOLHETOS

PROMOVO WORKSHOPS

FAÇO ENCONTROS


E, PARA FINALIZAR

NÃO SEI MAIS O QUE FALAR

SEI QUE FALO INGLÊS

SOU BRASILEIRO

DA LÍNGUA PORTUGUESA

PORTANTO, THE END.


Clique em http://youtu.be/P8PVaZQKibI para ouvir a música criada à partir desta poesia pelo músico João Cantiber e pela cantora Mari Blue

O NÓ DO DESPREZO



A história que vou lhes contar é minha, talvez, sua também. Já aconteceu várias vezes aqui no Rio de Janeiro, no famoso calçadão de Copacabana. Todavia, acontece também, por todo Brasil, nas vitrines de lojas, enfim, em cada esquina onde a informação veicula e na boca de muita gente.

Será que o calçadão é nosso ou dos turistas internacionais. O ideal é que fosse de todos. No entanto, nem sempre me senti uma brasileira em alguns eventos importantes que aconteceram por aqui. Em vários deles, me senti em outro país, principalmente no que diz respeito à forma como as informações foram transmitidas. Olhando para os cartazes e faixas espalhados por vários locais do calçadão e palcos onde shows seriam realizados, me vi várias vezes perdida sem saber qual evento seria realizado. Por incrível que pareça, não foi utilizada a língua portuguesa para veicular a informação; apenas o inglês. Será que os organizadores destes eventos se esqueceram que estavam no Brasil? Será que acharam que a nossa língua oficial era o inglês? Ou será que menosprezam ou desprezam a nossa cultura e a grande maioria do povo brasileiro? Será que todos os brasileiros que frequentam a praia de Copacabana dominam o inglês? E, mais... Será que todos os turistas internacionais possuem também este domínio? É óbvio que não! Como é que uma secretaria de cultura pôde permitir um desrespeito deste à nossa identidade e à nossa língua? Como pôde acontecer isto dentro do nosso próprio território? Acho fundamental que todas as informações, principalmente numa cidade turística, sejam repassadas em várias línguas diferentes de maneira a facilitar a compreensão de tudo que o evento queira repassar para o público. Mas, parece que se esquecem do português com bastante frequência. Quantas vezes, tive que pedir ajuda a pessoas que falavam o inglês fluentemente para traduzir cartazes e faixas espalhadas pelo calçadão. Fiquei imaginando o número de pessoas que estariam transitando por ali com as mesmas dificuldades. Lamentando o fato, alguns brasileiros me aconselharam com uma pedante convicção: “Voce é quem está ultrapassada. Faça inglês se quiser compreender!”

Muitos brasileiros são mal avaliados e sofrem, de certa forma, um certo preconceito por não terem o domínio de outras línguas estrangeiras, principalmente o inglês. É constrangedor! Concordo plenamente que nos enriquecemos muito com o domínio de outras línguas estrangeiras, no entanto, quantos brasileiros podem ter acesso aos cursos de língua estrangeira neste país? Se estamos lutando ainda por uma educação para todos; se estamos ainda lutando para reduzir  o índice de analfabetismo em nosso país; se grande parte de nosso povo não consegue ainda decifrar a língua portuguesa; como podemos cobrar de nosso povo o domínio de uma língua que não seja a nossa? E tem mais... Daqueles que podem ter acesso aos cursos de língua estrangeira, quantos deles realmente querem isto? Dentro deste país, que ainda se chama Brasil, acho que poderíamos esperar, no mínimo, o respeito àqueles que possuem ainda a liberdade e o desejo de querer falar a própria língua.



O desprezo é sempre dirigido àquilo que subestimamos ou julgamos menor. Dói muito constatar que uma língua tão bonita quanto o português estará fadada ao esquecimento se não respeitarmos a nossa identidade. Usei a nossa língua como um exemplo, pois me deparo frequentemente com pessoas que já não conseguem mais encontrar palavras em português para designar termos muito simples. Percebo que o esforço é bem maior para buscar no inglês expressões ou palavras que o nosso dicionário e gramática oferecem com tanta fartura. Menosprezamos nossa riqueza linguística, dentre muitas outras que se perdem e se perderam por aí. Quero salientar que não sou contra a utilização de outras línguas no nosso universo linguístico; pelo contrário, acredito que esta abertura seja por demais enriquecedora. Só não acho justo uma abertura unilateral onde o universo estrangeiro engole aquilo que temos de mais valioso e nos faça esquecer aquilo que somos.  

O desprezo é uma erva daninha capaz de nascer em qualquer jardim. Nem sempre achamos que uma pessoa comum possa ter um tesouro a nos oferecer. Sabem por que? Porque o nosso egocentrismo não deixa. Inflamos o nosso ego para não perceber a riqueza do outro, enxergando apenas aquilo que a nossa arrogância medíocre permite. Os padrões sociais de valorização pessoal também nos ensinaram que é necessário  brilhar muito para  receber apreço e credibilidade. É necessário brilhar com títulos, poder, dinheiro, status, enfim com uma série de futilidades que não mostram o verdadeiro valor de um homem. Criou-se, à partir destes critérios sociais, as profissões mais importantes e as menos importantes, bem como pessoas, cargos, assuntos, idiomas, etc. Tudo passou a ser uma questão de mercado. A importância atribuída a algo é diretamente proporcional ao montante de dinheiro que gira ao redor daquilo. Sedentos por um lugar no ranking social, passamos a focar a nossa atenção apenas naquilo possa nos garantir uma posição privilegiada ou no mínimo segura. Focando a nossa atenção apenas nestas coisas, desfocamos para outras muito importantes e nos cegamos para o essencial. Muitas virtudes essenciais ao nosso desenvolvimento espiritual e humanitário são descartadas ou no mínimo, ficam relegadas em segundo plano. A simplicidade perde seu espaço para a sofisticação e complexidade; a sinceridade perde espaço para a falsidade e por aí vai. Fingimos ser aquilo que a sociedade privilegia e deixamos de ser nós mesmos. Com isso, somos capazes de desprezar riquezas incomensuráveis, tais como a nossa cultura, nossa língua, enfim nossos valores mais profundos. Tornamo-nos superficiais e pedantes.

Para mostrar o nosso desprezo, humilhamos quem é simples, ou mais precisamente, quem nos mostra aquilo que insistimos negar dentro de nós mesmos. O nosso desprezo é uma maneira perversa de dizer: “Eu sei o que você não sabe” ou “Eu sou o que você não conseguiu ser”. No entanto, nas profundezas do nosso inconsciente, num lugar onde não há espaço para a falsidade, estamos dizendo com todas as letras: “Temo não saber” ou “Temo não ser reconhecido”.

Fico muito preocupada quando vejo a nossa cultura e nossa língua ser desprezada dentro de nosso próprio país. Se lá fora ela não vale tanto, deveríamos, no mínimo, reconhece-la e valoriza-la nos limites de nossa Terra, se é que temos alguma. Muitos se preocupam com o risco de nações estrangeiras tomarem o nosso chão. No entanto, nossa língua está sendo roubada dentro de nosso próprio território e ninguém diz nada. Talvez possam dizer um dia: Stop! Este silêncio é uma consequência daquilo que restou de nosso idioma. Com a língua roubada, nos resta a mudez. A melhor maneira de escravizar um povo é roubando dele a sua identidade. Estamos perdendo a nossa identidade brasileira. Achamos bonito ser como o povo de fora, das ditas nações desenvolvidas. Temos vergonha de nós mesmos. Temos muitos motivos para nos envergonhar, mas não podemos esquecer que temos também, muitos motivos para nos orgulhar de nós mesmos. Somos como qualquer nação, cheia de erros e acertos. Se estivermos errando, precisamos cobrar de todos os brasileiros uma postura mais acertada. Não é desprezando o nosso país que iremos reerguê-lo. Precisamos aprender a lutar contra os estrangeiros e brasileiros desnaturados que nos dão rasteiras. E, o melhor golpe é reconhecer a nossa cidadania brasileira apropriando, de fato, da riqueza de ser brasileiro. Somos uma nação nova que precisa ainda crescer muito. Precisamos aprender também com todas as nações do mundo, sejam elas mais ou menos desenvolvidas do que nós. Precisamos de exemplos, porém sem perdermos a nossa identidade. O mesmo vale para cada indivíduo. Todo ser tem os seus recursos e as suas limitações. O reconhecimento de si mesmo e do outro é o primeiro passo em nosso processo evolutivo.

Aquilo que parece pequeno pode ser grandioso; tão grande que os nossos olhos débeis não conseguem enxergar por inteiro. Frequentemente, enxergamos apenas a parte do todo que nos interessa e  criamos a falsa ilusão de que conhecemos a realidade. Agarramo-nos a esta ilusão com toda prepotência para não sentirmos impotentes e pequenos demais. Diante do todo, tudo é importante e nada é mais importante.  Assim, aquilo que não parece ser valioso segundo as lentes de nosso desprezo é, na verdade, muito mais do que conseguimos apreender. Só a humildade é capaz de nos situar frente a realidade,  nos proteger de nossa arrogância e recuperar a nossa visão.

Tomados pela arrogância, desprezamos além de nossa identidade, muitas riquezas importantes. Desprezamos aqueles que erroneamente julgamos inferiores. Desprezamos a natureza por acreditar que ela está fadada a nos servir. Desprezamos a nós mesmos quando não possuímos auto-estima suficiente. Nossos preconceitos sustentam o desprezo que sentimos. Precisamos aprender a nos relacionar com tudo e com todos. Precisamos aprender a doar e receber.  E, lembrar sempre: Aquilo que desprezo é, na verdade, o que mais  temo nas profundezas de meu ser.”

Se você é daqueles que usa o desprezo para se sentir maior do que aqueles que você julga menor que você, talvez a história abaixo possa lhe ensinar a valorizar “aquilo que não parece ser ou ter valor”. Esta história, ao contrário de todas as historinhas inventadas por mim, foi, na verdade, um acontecimento ocorrido com meu pai a muitos anos atrás quando ele iniciou a sua vida profissional. Em alguns momentos, tem história verdadeira que parece história inventada.



O Anjo da Estrada


Parados na estrada a várias horas, sem saber o que fazer com  um caminhão enguiçado insistindo em não funcionar, três homens, já cansados e prestes a desistir do problema, foram abordados por uma criança curiosa:

-Moço, o que aconteceu com seu caminhão?

-Some daqui, menino! Berrou o assistente do motorista sem dar a mínima atenção ao menino e  bastante incomodado com a presença do mesmo.

Antes que o menino fosse embora carregando desapontamento e humilhação, o motorista, dono do caminhão, o chamou carinhosamente:

-Ei, garoto! Não liga para este moço não, ele é muito ignorante. O meu caminhão deu defeito, mas não sabemos ainda o que aconteceu. De repente, ele parou de funcionar... O mecânico já chegou para resolver o problema, mas não  conseguiu ainda descobrir o defeito.

O garoto deu uma olhada no motor do veículo como se entendesse de mecânica, e falou:

-Sabe o que é, moço... Outro dia o caminhão do meu tio também parou de funcionar assim, sem mais nem menos. Aí, eles deram uma balançada nele e ele começou a funcionar de novo.

-Balançada? Como assim? Perguntou o motorista achando estranho o comentário do garoto.

-Ah, moço... Eu até achei esquisito, mas deu certo. Juntou um monte de gente e começaram a balançar de um lado para o outro. Depois disto, viraram a chave e pronto. O motor funcionou direitinho.

Antes que o menino continuasse dando suas explicações, o mecânico olhou animado para o motorista sugerindo:

-Acho que pode dar certo. Vamos tentar? Vocês dois balançam de um lado e eu balanço do outro. Quem sabe...

O assistente do motorista franziu a testa desanimado e com ironia continuou:

 - Deixa de brincadeira, desde quando esse pedaço de gente sabe alguma coisa ?

- Mas, faz sentido o que ele falou - justificou o mecânico.

-Faz sentido nada! Resmungou o assistente.

-Se faz ou não faz, eu quero tentar. Até esse momento, pelo que eu sei, você trabalha para mim. Vamos lá, faça a sua parte, ajude a balançar! Determinou o dono do caminhão.

Muito a contra gosto, o assistente ajudou a balançar o veículo. O garoto sentindo-se considerado e cheio de moral pôs-se a ajudar oferecendo a sua força de criança, porém revestida com uma determinação de adulto. Antes que o mal educado assistente pudesse novamente oferecer a sua ironia, o motorista correu até a cabine e virou a chave. O caminhão estremeceu-se todo, roncou forte como se quisesse dizer:

-Funcionei!

O dono do caminhão olhou no fundo dos olhos de seu assistente dizendo:

- Nunca duvide da boa vontade e da sabedoria de uma criança.

O assistente não sabia onde esconder a sua cara. Da ironia ao espanto, engoliu seco e com seu olhar no chão, não teve a coragem e nem mesmo a humildade de pedir desculpa ao garoto que salvou o seu dia. No entanto, o dono do caminhão se aproximou do garoto e externando gratidão disse:

-Muito bom! Senão fosse por você, ficaríamos nesta estrada até sei lá quando...

-É verdade! Confirmou o mecânico.

O dono do caminhão lhe ofereceu uma boa gorjeta, mas o que o garoto queria mesmo, já tinha conseguido: ajudar e ser reconhecido.

Quando ouço histórias assim, fico pensando até que ponto este garoto não era um anjo da  guarda querendo não somente ajudar, mas sobretudo dar o seu recado:

"Não subestime nada e ninguém. Por menor que possam parecer, as pequenas coisas podem nos trazer grandes soluções".



ESPAÇO DE REFLEXÃO



Marque abaixo as atitudes que você adota, mesmo que eventualmente. Depois desta reflexão, esforce-se para não continuar desprezando pessoas ou situações que poderão torna-lo um ser  mais humano que realmente preza a vida que lhe foi confiada.


(  ) Me acho mais importante que certas pessoas

( ) Não possuo desejo ou tempo para escutar pessoas socialmente consideradas inferiores a mim

(  ) Acho que crianças, empregados ou “subalternos” foram feitos apenas para obedecer

(  ) Não levo a sério o que  crianças falam por considera-las imaturas

(  ) Acho os “velhos” ultrapassados

(  ) Sempre achei meus pais caretas, bem como as pessoas da idade deles

(  ) Adolescentes são tolos aborrecentes

(  ) Sinto vergonha de me relacionar com pessoas muito simples

(  ) Menosprezo os conhecimentos populares

(  ) Acho minha língua “brega’, por isso, utilizo com bastante frequência palavras estrangeiras para passar uma impressão de que sou sofisticado

(  ) Subestimo pessoas com baixo nível de instrução

( ) Rejeito pessoas de grupos sociais, raciais, religiosos e culturais diferentes do meu

( ) Tenho uma grande tendência a valorizar apenas os países ditos desenvolvidos, ou estados e  cidades mais desenvolvidas que a minha

(  ) Não me interesso pela história ou cultura dos ditos países de 3º mundo

(  ) Valorizo apenas quem é hierarquicamente igual ou superior a mim




DESAFIO


Escolha uma pessoa que voce julga inferior a voce em algum aspecto e se dedique a conversar profundamente com ela durante, pelo menos, uma hora. Procure identificar um potencial bem desenvolvido na mesma e pouco desenvolvido em voce. Feito isto, a distância entre voces diminuirá significativamente.