segunda-feira, 23 de abril de 2012

O NÓ DA MENTIRA



SE EU SOUBESSE DIZER A VERDADE
EU NÃO JUSTIFICARIA NADA
EU NÃO DARIA DESCULPAS
EU NÃO INVENTARIA HISTÓRIAS
EU SIMPLESMENTE DIRIA
AQUILO QUE SEI E ACREDITO
QUE PODERIA NÃO SER A DITA VERDADE
PODERIA ATÉ SER UMA GRANDE MENTIRA
EXPRESSA COM A MELHOR INTENÇÃO
DE UM CORAÇÃO QUE MESMO ENGANADO
NÃO DESEJARIA NUNCA
ENGANAR NINGUÉM



NO ENTANTO...
EU NÃO SOUBE DIZER A VERDADE
FANTASIEI MINHAS MENTIRAS
COM UMA VERDADE QUE ANSIEI SER MINHA
 VERDADE QUE NÃO CONSTRUÍ
POR NÃO TER A MATÉRIA PRIMA PARA ERGUÊ-LA
VERDADE DESTRUÍDA PELO MEU MEDO
MEDO DE PERDER-TE
MEDO DE PERDER O MEU CHÃO
QUE AGORA FALTA-ME
ROUBANDO O MEU
 E O SEU EQUILÍBRIO



QUISERA, EU
SER VERDADEIRO
QUISERA EU SER EU
EU VERDADEIRO
UM EU QUE VOCE NÃO CONHECEU
PARA QUE VOCE PUDESSE SER
UM SER QUE NÃO CONHECI
QUIS MANIPULAR O SEU DESTINO
MAIS DO QUE ISTO, A SUA VIDA
CONSTRUIR A MEU MODO SUA HISTÓRIA
QUIS SER DEUS
ACABEI SENDO O DIABO



NÃO DEIXE QUE MINHA MENTIRA
TE INFERNIZE
 EXPULSANDO-O DO SEU PARAÍSO
VIVA A SUA VERDADE
LIBERTE-SE ATRAVÉS DELA
ROGO A DEUS
A VERDADE QUE LHE NEGUEI
ROGO A TI
O PERDÃO
POR TER ROUBADO PARTE DE SUA HISTÓRIA
QUE AGORA É TODA SUA
LÍMPIDA E CRISTALINA

  

NÃO MENTI POR AMOR
MENTI POR MEDO
FALTOU-ME SABEDORIA
JAMAIS O AMOR
QUE SUFOCADO PELO MEDO
APRISIONOU A VERDADE
QUE  A TI PERTENCIA
NA CLAUSURA DA MENTIRA
A VERDADE FICOU ATÉ ONTEM
HOJE, SE LIBERTOU
 AGORA, É TODA SUA


USUFRUA ESTE NOVO SABOR
O SABOR DA NOVA HISTÓRIA
TEMPERADA PELA VERDADE
 TRARÁ INICIALMENTE
ESTRANHEZA AO SEU PALADAR
NÃO SEI SE AMARGA
AZEDA OU PICANTE
NÃO SEI SE SALGADA
OU ADOCICADA DEMAIS
SÓ SEI QUE TEM GOSTO
A PRINCÍPIO DESGOSTO
MAS, UM GOSTO COM GOSTO
CAPAZ DE APURAR
 O SEU PALADAR


TRANSFORME-SE
TRANSFORME A MINHA FRAQUEZA
ALIMENTADA PELA MENTIRA
EM ALGO MAIOR QUE ELA MESMA
TRANSFORME A HISTÓRIA
QUE EU NÃO SOUBE TRANSFORMAR
EM ALGO MAIOR QUE A MENTIRA
QUE A NUTRIU, ENVENENANDO-A
TRANSFORME TUDO QUE NÃO VALEU À PENA
NUMA PENA QUE VALHA SER MAIS
SER MAIS VOCE MESMO
APESAR DE TUDO




O NÓ DA MENTIRA




Calipso adorava mentir, pois a verdade sempre fora dura demais para ele enfrentar. Fruto de uma mentira, Calipso nunca conseguiu compreender a sua verdadeira identidade. Tinha sempre a impressão de ser algo que, na verdade, não era. Era produto de uma relação incestuosa do tio com a mãe, embora não tivesse acesso a esta verdade. Tinha uma história de vida, no entanto, mal contada. Precisa acreditar na versão contada pelos familiares de que a mãe não sabia quem era seu pai. A mãe  morreu quando ele era ainda um bebe. Vítima da loucura e de um câncer, jamais pode contar a sua versão ao filho. Pressionada por uma família tradicional e religiosa, será que contaria?
 A história de Calipso cheirava algo proibido. Desde pequeno foi educado a jamais entrar no terreno proibido de sua verdadeira história. No entanto, sentia um impulso genuíno pelo proibido que lhe fora proibido conhecer. Se a verdade era o terreno proibido, melhor adentrar no terreno das mentiras para não criar problemas.
Calipso criava as mais loucas histórias, ora para se sentir aceito, ora para se sentir mais valorizado, ora para se safar das maluquices que aprontava. Até ser desmascarado, a maioria das pessoas acreditava nas suas histórias mentirosas. Sabia mentir, como ninguém, afinal fez mestrado e doutorado em mentira na escola fundada pela própria família. Sentia também, um certo prazer em mentir para a família. Talvez, quisesse, inconscientemente, puni-la, usando o mesmo veneno utilizado por esta. O mais engraçado é que a família se achava no direito de se irritar e se surpreender com as mentiras de Calipso. Enxergava as mentiras do mesmo, mas não enxergava as suas próprias.
Assim que eu tive acesso à verdade de Calipso, este nunca mais retornou a terapia. A família deu um jeito de poupa-lo mais uma vez de sua verdadeira história. O motivo do afastamento de Calipso, justificado por uma tia, fazia parte da coleção de mentiras do álbum familiar. Não sei o que aconteceu com Calipso, só sei que foi morar e estudar numa outra cidade bem distante. Quanto mais distante ele ficasse da verdade, melhor para a família que desejava preservar a imagem de família bem estruturada. No entanto, para preservar esta imagem, Calipso foi sacrificado e mostrava a sua desestrutura nas mentiras que contava e nas loucuras que aprontava. Perdeu, com o tempo, a credibilidade das pessoas. Tornou-se, assim como a mãe que enlouqueceu, o bode expiatório das loucuras de uma família perversa. Não sei se Calipso enlouqueceu ou vai enlouquecer um dia; só sei que, assim como todo louco, jamais viveu a realidade; era, suficientemente, criativo para criar as mais alucinantes histórias que pudessem encobrir a sua própria e dar mais sentido e um toque de prazer na sua realidade.


Existem mentiras de todos os tamanhos. A de Calipso era grande demais, pois o privava  da própria história e da própria identidade. Este tipo de mentira, destrói uma vida ou a torna, no mínimo, confusa e complicada; difícil de viver. O indivíduo tem a impressão de não pertencer à própria história. Sente-se desalojado de si mesmo e sem chão. Quando a realidade que desenha a nossa história nos é negada, perdemos o nosso chão. Uma pessoa sem chão, flutua; está sempre dispersa, alheia ao mundo e àquilo que deveria viver. Está sempre confusa, sem saber se deve ou se pode viver certas experiências, pois tem sempre algo proibido e incerto inscrito na sua certidão de vida.
Alimentar-se de mentiras é uma dieta indigesta para quem deseja amadurecer. Mentimos todas as vezes que nos negamos responsabilizar pela nossa própria vida, pelas nossas escolhas, pelos nossos erros. Mentimos por medo, tentando  esconder nossas fraquezas. Mentimos quando não desejamos enxergar uma faceta da nossa personalidade que mostra as nossas imperfeições. Mentir é uma atitude imatura e infantil frente ao confronto com a nossa maturidade e condição de adulto. Uma mentirinha pequena pode até não fazer tanto mal e nos safar de conflitos que seriam melhor evitar. No entanto, esta mentirinha nos impede de fazer uma reflexão um pouco mais profunda: Será que não existiria uma forma mais inteligente, responsável e sábia de evitar este mesmo conflito? Será que ao invés de mentir, eu não deveria ter usado outros meios mais maduros para evitar aquilo que eu não dou conta de assumir?
Aprendemos a mentir com as próprias estruturas educativas, tais como a família, a escola e a sociedade de uma forma geral. A criança reproduz aquilo que viu alguém fazer. A mentira, às vezes, é tão arraigada ao comportamento dos pais, que estes nem percebem que mentem. Só diante do espelho chamado filho é que percebem a gravidade de uma mentira. Assim como Calipso, o filho utiliza o mesmo veneno utilizado pela família para se safar dos conflitos. Só que a fama de mentiroso recai apenas no mais fraco, e a criança acaba sempre levando a fama. Eleger um bode expiatório é uma forma perversa, porém usada por muitas famílias insanas e falsas para se proteger de uma imagem que não desejam assumir. Os pais mentem para o filho, o professor mente para o aluno, o poder legislativo e judiciário que deveriam ser os grandes representantes da verdade em nosso país mentem para o povo brasileiro. Com tanta mentira, onde fica a verdade? Ela se encontra apenas no espaço comprometido com o seu desenvolvimento, com a sua maturidade e  com a sua evolução. No Yoga, o preceito de Satya  nos convoca a sermos verdadeiros para atingirmos a iluminação. No entanto, em nome das vantagens pessoais que nosso ego anseia, optamos, na maioria das vezes, por permanecermos na sombra da ignorância.
Por trás da mentira tem, muitas vezes, o medo – medo de crescer, assumir as consequências pelos próprios atos, ser responsável pela própria vida, ser julgado, ter que lidar com a frustração quando as coisas não saem exatamente do jeito como a gente imaginou. Só dá conta de ser verdadeiro, quem enfrenta os próprios medos.
Em muitos casos, a mentira vem dar suporte ao desejo de querer levar vantagem em tudo. O mentiroso, neste caso, não suporta a ideia de ser como a maioria. Inventa uma realidade que possa lhe dar privilégios. É uma eterna criança ligada ao princípio do prazer. O princípio da realidade é evitado, pois é duro demais para uma personalidade fragilizada.
A quem tenha uma auto-estima muito baixa e necessite de uma mentira que possa elevar o seu valor, mesmo que ilusoriamente. Aliás, quem mente, adora uma ilusão.
Justificamos sempre as nossas mentiras, mas não fazemos o mesmo quando somos vitimados pela mentira do outro. A mentira dói quando somos o alvo da mesma. Quando fazemos do outro o nosso alvo buscamos sempre uma razão recheada de hipocrisia.
A verdade é relativa. Depende muito do nosso posicionamento frente uma situação. Ela pode mudar frente uma série de fatores. Questões temporais, culturais, tecnológicas, sociais, dentre outras podem transformar uma verdade numa grande mentira ou vice versa. A Terra já foi quadrada, o sol já girou em torno da Terra, vários medicamentos que curavam agora matam,  e por aí vai...Muitas mentiras são fruto de nossa ignorância, outras de interesses de grupo que almejam o poder. Só o tempo e o desenvolvimento de nossa consciência tem o poder de revelar aquilo que nos é velado. No entanto, há quem peça a mentira acima de tudo – “Não me revele o que não dou conta de administrar”. Preferem, acima de tudo, uma mentira que possa anestesiar a dor que a verdade causaria.
Há também os falsos emissários da verdade. Usam a verdade para ferir, punir e para justificar a sua arrogância e falta de educação. Não basta falar a verdade. É necessário saber como e quando evoca-la. Comunicar a verdade é, de certa forma, uma arte. São raras as pessoas que dominam o exercício eficiente da mesma. Poucos sabem utiliza-la com sabedoria. A verdade, quase sempre, precisa ser acolchoada com carinho, respeito e amor para não ferir. Caso contrário, entra dura cortando e podando o que precisa desenvolver.
Educar o outro e educar a si mesmo para a verdade é um grande desafio. A historinha abaixo pode lhe dar um toque educativo neste sentido.



CARA DE CEGONHA


Sabrina, uma menina de 5 anos perguntou a mãe:
—Mamãe, como é que voce ficou me esperando?
—A cegonha lhe trouxe, querida.
—E esta barriga tão grande que está na foto, mamãe?
—A cegonha pôs voce dentro da barriga da mamãe.
—Como é que a Cegonha me enfiou ai?
—Ela abriu minha barriga.
—Com que?
—Com um bisturi.
—O que é bisturi, mamãe?
—É tipo uma faquinha.
—A Cegonha te esfaqueou? Perguntou, Sabrina, assustada e com os olhos arregalados.
—Não, ela só abriu a minha barriga. Ela sabe fazer isto sem dor.
Um mês depois a mãe é surpreendida e grita apavorada:
—Sabrina! O que você está  fazendo com esta faca na mão?
—É para abrir minha barriga, mamãe.
—Pra que, minha filha?
—Para colocar a Paty lá dentro. Respondeu Sabrina apontando para a boneca ao lado.
—De onde você tirou esta ideia?
—Da Cegonha.
—Que Cegonha? Perguntou a mãe confusa como se nunca tivesse ouvido falar em Cegonha.
—Da Cegonha que me colocou na sua barriga. Respondeu, prontamente, a filha.
—Nenhuma cegonha te colocou na minha barriga, sua maluca! Repreendeu a mãe, de forma áspera,  a inocência da menina.
—Mas, foi você quem me disse isto. Justificou a filha.
—Nem tudo que a mamãe diz é verdade.
—Como assim, mamãe. Não é você que vive me dizendo para falar só a verdade?
—É,  mas...Titubeou a mãe sem saber o que dizer.
—Já entendi. Não é para falar mais a verdade.
—Não! Absolutamente! É para falar a verdade  sim. Ordenou a mãe, arrependida com a confusão que gerou na cabeça da filha.
—Não estou entendendo mais nada... Se for para falar a verdade, como é que você me falou uma mentira
—Foi por que... Por...
—Por que, mamãe? Completou Sabrina.
—Por que eu estava com vergonha.
—Já entendi tudo!
—Entendeu o que, menina! Vê se você tem idade para entender alguma coisa? Subestimou a mãe a sabedoria da filha.
—Eu entendi que você pôs cara de cegonha numa atitude sem vergonha.
A mãe quase caiu para trás. Meio sem fôlego, perguntou:
—De onde você tirou isto, menina!
—Meu coleguinha falou que a irmã dele está esperando neném...
—E o que isto tem haver com a nossa história?
—Ele falou que aconteceu isto porque ela é sem vergonha.
A mãe cada vez mais desesperada, sem saber como arrumar a bagunça que criou na cabeça da filha, lamentou exasperada:
—Que confusão eu criei na sua cabecinha. Desculpe-me, filhinha! Mamãe errou, mas promete que não fará mais isto. Eu vou lhe explicar melhor toda esta história.
A filha percebendo o desespero da mãe tentou confortá-la utilizando todo seu conhecimento infantil em processo de alfabetização:
—Preocupa não, mamãe. Você errou só por uma silaba. Trocou o Ver pelo CE. E, se a gente misturar estas letrinhas... Cer-ve – silabou a menina –  “Cerve” o que voce me contou - continuou.
—Serve não, filhinha. Serve escreve com S e não com C.
—Mas, se Vergonha virou Cegonha... O S pode virar C.
—Acho melhor o S continuar sendo S e o C continuar sendo C.
—Por que mamãe?
—Porque senão um dia, a Sabrina linda que eu estou vendo aqui, pode resolver deixar de ser Sabrina para ser outra coisa que a mamãe não vai gostar de ver. Você merece ser Sabrina sempre. Para isto, eu tenho que fazer a minha parte.
—Que parte, mamãe?
—Eu tenho que te contar sempre a história verdadeira.
A mãe colocou a filha no colo e fitando-a nos olhos contou a história que toda criança anseia um dia saber. Na linguagem da filha, usando os recursos que uma criança de cinco anos é capaz de entender, ofertou à mesma, uma verdade que lhe pertencia e que jamais poderia lhe ser negada ou escondida. No final da historia, recebeu como retorno, um sorriso radiante da filha e uma opinião envolta pela simplicidade que falta a todos os adultos:
—Mamãe, esta historia é muito mais interessante! Prefiro muito mais a participação do papai do que de uma Cegonha. Esse bicho, eu não conheço e nunca vi. O papai, eu amo e vejo todo dia. 
A mãe não titubeou em dar à filha um abraço bem verdadeiro, daqueles que só quem ama muito sabe dar.



ESPAÇO DE REFLEXÂO



Pense


1)    Qual foi a maior mentira que você falou ou viveu em sua vida?

2)    Você foi movida por quais sentimentos quando inventou esta mentira?

3)    Que responsabilidades você estava evitando assumir sustentando esta mentira?

4)    O que lhe impedia de assumir esta responsabilidade?

5)    Que parte sua não desejava crescer, negando-se assumir esta responsabilidade?

6)     Quais foram as consequências positivas desta mentira para a sua vida e para a pessoa que voce mentiu?

7)    Quais foram as consequências negativas desta mentira para a sua vida e para a pessoa que voce mentiu?

8)    O que poderia ter acontecido se você tivesse evitado esta mentira, falando ou vivendo a verdade?

9)    Que marcas esta mentira deixou em sua história?

10)Veja-se, agora, vivendo esta história que, você alicerçou com a mentira, de uma maneira diferente, ou seja, alicerçando-a com a verdade.

      11)O alicerce da verdade desperta quais sentimentos em você?

      12)Voce foi perdoado pela pessoa que voce mentiu?

Agora, voce é o alvo...


1)    Qual a maior mentira contada a voce?

2)    Quem lhe contou esta mentira foi movido por quais sentimentos?

3)    Que responsabilidade esta pessoa estava querendo fugir ao lhe contar esta mentira?

4)    Que parte desta pessoa não queria crescer negando-lhe a verdade?

5)    Quais foram as consequências positivas desta mentira para a sua vida e para a pessoa que mentiu para voce?

6)    Quais foram as consequências negativas desta mentira para a sua vida e para a pessoa que mentiu para voce?

7)    O que poderia ter acontecido se esta pessoa tivesse falado a verdade para voce?

8)    Que marcas esta mentira deixou na sua história?

9)    Veja-se agora vivendo esta verdade que lhe foi negada.

10)Esta verdade desperta quais sentimentos em voce?

11) Voce já perdoou a pessoa que mentiu para voce?



DESAFIO


Escolha uma verdade, dentre as que voce esconde, e revele a quem será por ela beneficiado.










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